Rodrigo Ferreira - Presidente-executivo da Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia (Abraceel)
A sociedade está relativamente alheia a uma das mais importantes reformas da nossa economia, a do setor elétrico. Prestes a ser aprovada no Congresso Nacional, ela apresenta perspectiva de impactar significativamente a vida e o bolso dos brasileiros, com potencial para causar transformação similar à ocorrida a partir da privatização das telecomunicações e da ascensão dos bancos digitais. Já aprovado no Senado Federal, o PL 414/2021 determina que, em até 42 meses, todos os consumidores tenham o direito de escolher o próprio fornecedor de energia elétrica e exercer a portabilidade da conta de luz.
A permissão para escolher um novo fornecedor de energia elétrica causará competição pelo consumidor, com benefícios na forma de preços reduzidos, melhores serviços e produtos customizados. Será um verdadeiro choque na economia, com potencial de gerar, até 2035, R$ 210 bilhões de redução nos gastos com energia elétrica, 642 mil empregos e um desconto médio de 27% na compra de energia. Essa redução no preço da energia, que é um dos componentes da tarifa, permitirá uma diminuição média na conta de luz de 15%, benefícios que contribuirão para desacelerar em 0,61 ponto percentual o IPCA.
Não é pouca coisa. Somente em 2021, por exemplo, o IPCA subiu 10,06% enquanto a tarifa de energia elétrica aumentou 21,21%, com impacto de 0,98pp no índice oficial de inflação. Em período mais abrangente, entre 2015 e 2021, enquanto o IPCA registrou variação de 6,7% ao ano, a tarifa da energia elétrica residencial registrou um aumento médio anual de 16,3%, ou 137% acima da inflação. Nesse mesmo período, os preços do mercado livre subiram apenas 36%, ou 25% abaixo da inflação.
Essa escalada nas tarifas reguladas de energia tem sido percebida pela sociedade. Desde 2015, entre 80% e 90% dos brasileiros vêm indicando, ano após ano, que o preço da energia está caro ou muito caro, segundo pesquisas anuais conduzidas pelo Ibope e Datafolha. Além disso, é recorde a vontade da população de poder escolher o seu fornecedor de energia, pois 8 em cada 10 brasileiros desejam a portabilidade da conta de luz.
É importante ressaltar que as distribuidoras continuarão a entregar eletricidade para cada consumidor. Já a energia elétrica propriamente dita poderá ser comprada de centenas de comercializadoras existentes em um ambiente competitivo.
Atualmente, há apenas 10 mil consumidores no mercado livre de energia. É uma quantidade muito pequena, que representa 0,029% dos 87 milhões de consumidores, contingente composto por grandes indústrias e comércios. Com a aprovação do PL 414/2021, todos os consumidores, grandes ou pequenos, serão livres para escolherem o próprio fornecedor de energia elétrica.
Quando isso ocorrer, um enorme mercado de varejo começará a surgir, gerando investimentos em propaganda e digitalização não somente nas atividades de atendimento ao consumidor, mas principalmente nas de comercialização de produtos e serviços, onde os principais itens do catálogo serão a opção por energia renovável, condições especiais de preço e prazo, serviços adicionados no pacote de acordo com o perfil do cliente, pontos em programas de milhas e descontos para gasolina e supermercado, por exemplo. Onde o mercado livre de energia é realidade (toda a Europa, Japão, Austrália, entre outros), o consumidor é disputado — e também bajulado — constantemente.
Estabelecer um cronograma curto e exequível para abertura integral do mercado livre é uma das poucas boas notícias que o setor elétrico pode dar aos brasileiros após anos de sucessivos aumentos, alguns da ordem de dois dígitos.
Os números mostram que o acesso irrestrito ao ambiente de livre contratação de energia para todos os brasileiros trará benefícios econômicos e sociais significativos, ajudando a reduzir custos, gerar empregos, incrementar a produtividade e desacelerar a inflação. Os avanços tecnológicos e a criação de um novo mercado de varejo no Brasil vão impulsionar o surgimento de mais empresas e postos de trabalho, enfrentando sem subsídios e contorcionismos contábeis um problema premente, que é a escalada do preço da eletricidade no país. A reforma regulatória do setor elétrico, refletida no PL 414/2021, precisa ser concluída neste semestre, antes do processo eleitoral que se avizinha, oferecendo, depois de muitos anos de más notícias, uma boa-nova ao consumidor brasileiro.
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