MARIA NILCE MOTA - Superintendente de Ação Social e Filantropia do Centro de Integração Empresa-Escola (Ciee)
A desigualdade de gênero persiste como um grave problema social no Brasil. A despeito de todos os avanços da sociedade é inquestionável a forte influência do patriarcado na nossa formação como indivíduos. A relação homem x mulher continua desigual (de maneira sistêmica e cultural) e está presente no meio social, profissional e familiar.
Apesar de as mulheres brasileiras representarem a maioria da população (51,7%), isso está longe de ser traduzido em empregabilidade. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o IBGE, as mulheres lideram as taxas de desemprego e foram as que mais perderam oportunidades por conta da crise econômica desencadeada pela pandemia de covid-19. Quando falamos em cargos de liderança a disparidade na representatividade se torna ainda mais evidente. Ainda segundo dados do instituto, as mulheres receberam apenas 77,7% do salário dos homens em 2019.
Conforme escalamos a pirâmide hierárquica, a disparidade aumenta e as mulheres continuam a ter proventos menores, cerca de 61,9% do rendimento dos homens em cargos de gerência e diretoria. Àqueles que buscam desculpas para justificar o injustificável não poderão se utilizar do grau de instrução, uma vez que as mulheres ultrapassaram a escolaridade dos homens ainda em 1991, de acordo com Núcleo de Pesquisa em Gênero e Economia (NPGE), da Faculdade de Economia da Universidade Federal Fluminense (UFF). Avanço resultante meramente de decisões pessoais das mulheres, já que não foram desenvolvidas políticas públicas para facilitar maior acesso à educação.
O exercício da liderança ainda pressupõe combates recorrentes aos estereótipos sociais e culturais. A associação entre liderança e masculino ainda é potente na sociedade, e essa construção nunca levou em conta a jornada de trabalho não remunerado, tais quais, cuidados com as crianças, demandas domésticas e outras responsabilidades familiares, fazendo com que o esforço das mulheres para alcançar cargos de gestão seja maiores e mais desafiadoras.
Para alçar altos cargos, não é preciso apenas provar competência, é necessário comprovar repetidas vezes a sua capacidade pelo simples fato de ser mulher. A verdade indigesta é que as estruturas das organizações, historicamente, não nos consideram no papel de liderança, de poder ou influência. Os estereótipos normativos de gênero impregnados socialmente, em geral, remetem a liderança a características tidas como masculinas.
Soma-se, ainda, ao fato dessas referências históricas de liderança estarem atreladas ao masculino, não se levando em consideração os obstáculos que as mulheres enfrentam para se colocarem nessa posição. Contudo, também é preciso considerar e comemorar os avanços sem perder de vista o longo caminho ainda a percorrer. Para isso, além do combate aos estereótipos de gênero, é preciso aumentar a representatividade feminina no mundo do trabalho e nos cargos de liderança.
Temos como exemplo o Congresso brasileiro, em que a bancada feminina representa apenas 15% dos parlamentares, sendo que as mulheres constituem a maioria do eleitorado brasileiro. Segundo o Mapa das Mulheres na Política da Organização das Nações Unidas (ONU), o Brasil ocupa o 140º lugar no ranking de representação feminina no parlamento e um dos objetivos de desenvolvimento sustentável no Brasil é justamente a igualdade de gênero. É necessário pensar em estratégias nas organizações, mas também envolver atores sociais e econômicos para atuarem na redução da discriminação de gênero.
Um futuro sustentável e igualitário permanecerá fora de alcance enquanto as mulheres não tiverem a garantia de participação, em igualdade de condições e oportunidades na vida política, social e econômica do país. E essa não deve ser uma luta das mulheres e de todos que desejam viver em uma sociedade com justiça social.