Editorial

Visão do Correio: Educação contra o machismo

Entre janeiro de 2021 e o último dia 10 deste mês, foram registradas 2.928 ocorrências por agressão a mulheres pelo atual ou ex-companheiro no Distrito Federal. No último fim de semana, uma mulher foi esfaqueada no abdômen e encontra-se internada em estado grave, e outra morta por esganação. Em menos de três meses, foram quatro feminicídios.

A violência contra o universo feminino coloca o Brasil no rol dos 25 países mais perigosos do planeta. Entre março de 2020, quando eclodiu a pandemia do novo coronavírus, e dezembro do ano passado, 2.451 mulheres foram vítimas do ódio por gênero, e outras 100.398, inclusive vulneráveis, foram sexualmente violentadas.

No mesmo período, São Paulo registrou 315 feminicídios, seguido de Minas Gerais, com 303 casos, e Bahia, 202. O DF contabilizou 42 mortes por gênero. Na avaliação de especialistas, há uma epidemia de violência contra as mulheres. Embora seja cada vez maior o número de emancipadas financeiramente, os homens ainda se acham proprietários delas. Depreciam companheiras e as "coisificam".

Essa compreensão torpe, decorrente da cultura do machismo, é fortalecida tanto no ambiente doméstico quanto fora dele. Ou seja: como o racismo, a ideia de supremacia masculina está institucionalizada. Ela perpassa todos os setores e, dentro de casa, a mulher fica exposta à agressividade letal do "macho" que lhe exige subserviência plena.

Em contrapartida, as ações do poder público para proteger a mulher estão muito aquém das necessidades reais. Não raramente, as forças de segurança pública subestimam as ameaças e, por diferentes motivos, as medidas protetivas, asseguradas à mulher pelo Judiciário, não são garantidas, o que leva grande parte delas a óbito. Os homens desafiam as leis Maria da Penha e a do Feminicídio, que qualifica como hediondo o homicídio por gênero, com agravamento das sanções penais.

Apesar do aumento anual do número de casos, com poucas exceções em algumas unidades da Federação, as políticas públicas voltadas à proteção e ao empoderamento das mulheres foram substituídas pelo entendimento de que elas "devem obediência" ao marido ou ao companheiro. Uma visão retrógrada do Estado, que acaba por respaldar e estimular a cultura do machismo e do sexismo, gatilhos para uma ação letal contra a mulher.

Na maioria dos estados, já existem grupos de homens que promovem rodas de conversa, com apoio de terapeutas, sobre o comportamento deles ante companheiras ou namoradas. Essas iniciativas objetivam ressignificar o que é "ser homem", o que implica tratar as mulheres com respeito, dentro de um processo de educação para cultura de paz. Embora sejam poucos grupos, eles são o prenúncio de que a violência também é incômoda e rejeitada por uma parcela do universo masculino.

Há consenso de que a reversão desse comportamento torpe e descabido passa, necessariamente, pela educação, que começa dentro de casa e deve se estender à escola, em todos os níveis sociais. "É preciso mostrar que a violência não é natural, por isso a criação de políticas públicas são tão importantes", declarou a professora Edlene Oliveira Silva, do Departamento de História da Universidade de Brasília (UnB). Para isso, tanto a organicidade do Estado quanto dos setores privados precisam também se engajar na desconstrução do machismo e do sexismo, abomináveis e destoantes de quaisquer valores civilizatórios.

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