Não há dúvidas de que os reflexos do mega-aumento dos preços dos combustíveis serão pesados para a economia, sobretudo diante do fato de, no país, quase 90% das mercadorias transitarem por estradas. Das bombas dos postos aos alimentos que chegam às mesas dos consumidores, tudo ficará mais caro. Para se ter uma ideia do tamanho do estrago, basta ver o resultado da pesquisa Focus divulgada ontem pelo Banco Central. Os mais de 100 analistas ouvidos pela instituição elevaram, em apenas uma semana, as projeções de inflação deste ano de 5,65% para 6,45%. Também subiram as estimativas para 2023 e 2024. Trata-se de um quadro para lá de preocupante.
Nesse contexto, é natural que o governo e o Congresso se mobilizem para tentar conter a arrancada dos preços dos combustíveis. E isso foi feito na semana passada, com a aprovação, pelo Legislativo, e a sanção, pelo presidente da República, do projeto de lei que reduziu impostos federais e estaduais sobre o diesel, o biodiesel, o gás de cozinha e o querosene de aviação. A medida valerá até o fim deste ano, tempo que se espera que o mercado internacional de petróleo retorne à normalidade com o esperado fim da guerra entre a Rússia e a Ucrânia. Só a União abrirá mão de mais de R$ 20 bilhões em tributos nesse período. São tempos de emergência. Não há o que se questionar.
Contudo, é descabido o desejo eleitoral de Jair Bolsonaro de também zerar os tributos, mesmo que temporariamente, da gasolina, de olho em mais votos à reeleição em outubro próximo. Além de ser pouco eficiente, a medida, na verdade, só beneficiaria as classes média e alta, cujos integrantes fazem questão de não abrir mão dos carros, mesmo que seja para ir à esquina mais próxima. Por que não se fala em subsidiar a população mais pobre por meio do transporte público ou mesmo para os fretes de mercadorias? Isso, até agora, não foi aventado. Outro ponto importante: depois que se dá subsídios, é muito complicado retirá-los, especialmente em se tratando de um grupo de privilegiados barulhentos.
O que acontece hoje no Brasil deixa isso bem claro: quase 4% do Produto Interno Bruto (PIB) são gastos com subsídios a diversos segmentos da economia todos os anos. Por mais promessas que o governo faça de que cortará esses benefícios, nada avança, pois os lobbies em Brasília são pesados. A renúncia fiscal continua mesmo não se comprovando o retorno para a sociedade. Poucos ganham muito. E não será diferente se o Tesouro Nacional for obrigado a subsidiar gasolina, um combustível sujo, agressor do meio ambiente. O ministro da Economia, Paulo Guedes, está certíssimo em se posicionar contra tal aberração. Nas contas dele, a União perderia cerca de R$ 27 bilhões até o fim de 2022.
Em meio ao clima conturbado, contaminado pelas eleições, a pressão por mais subsídios só tende a aumentar. É preciso que os gestores públicos não se deixem levar por interesses pessoais na hora de tomar decisões. Os conflitos no Leste Europeu realmente desarranjaram o mundo, que tentava se recuperar de uma dramática pandemia, e isso exigirá medidas emergenciais para enfrentar a disparada da inflação e manter a economia funcionando o mais próximo possível da normalidade. Mas que tudo seja feito com transparência e racionalidade. Medidas eleitoreiras e sem critérios técnicos custam muito caro e comprometem o futuro. O Brasil já errou demais. Repeti-los é insanidade.