OPINIÃO

Visão do Correio: A linguagem do dólar e da bolsa

A valorização recente do real ante o dólar pode ter vida curta, assim como o bem — pouco visto no Brasil dos últimos tempos — que esse fenômeno pode trazer às necessidades de recuperação da economia, não fosse o que, de fato, move os investidores. A semana passada marcou queda de 1,53% da moeda norte-americana, embora no derradeiro pregão de sexta-feira a divisa tenha subido 1% e mostrado que pode ter terminado aquele fôlego de aparente indiferença à insegurança provocada no mundo pela guerra na Ucrânia.

O período de predominante euforia na bolsa brasileira reflete a intensa entrada de capital estrangeiro interessado em ações baratas e nos juros de dois dígitos (10,75% ao ano) que o governo brasileiro paga ao vender títulos no mercado financeiro. De fato, o Ibovespa fechou a sexta-feira com recuo de 0,6%, a 114.473 pontos, embora, no acumulado de três dias de pregões, tenha apresentado ganho de 1,17%. A expectativa dos investidores é de que, diante do confronto, produtos agrícolas e minerais cotados no mercado internacional se beneficiem de preços elevados por algum tempo.

Bancos como o Credit Suisse observaram que o real valorizado favorece o combate à inflação e implica redução da taxa básica de juros (Selic), a qual, quando elevada, encarece o crédito bem-vindo em períodos de reação da economia, desestimula os investimentos produtivos, a geração de empregos e renda. Outro resultado positivo estaria na melhora das condições para o equilíbrio fiscal do setor público.

Em posições opostas, o que atrai o investimento estrangeiro, e o país viu esse movimento sob o avanço das tropas russas, indica um revés para as famílias brasileiras, com seu orçamento já apertado pela queda do poder de compra. O mercado financeiro festejou os aumentos dos preços do petróleo e das commodities, produtos agrícolas e minerais com grande peso nas economias emergentes, como o Brasil, mas que são ingredientes capazes de gerar inflação interna. A disparada dos preços do petróleo, trigo, milho e soja pode afetar desde os preços do pãozinho de sal aos das carnes e da gasolina, além do frete das mercadorias em geral.

Com seguidas elevações, as cotações do chamado ouro negro atingiram na quarta-feira o pico dos últimos 10 anos. O barril de Brent do Mar do Norte para entrega em maio chegou a US$ 112,93. Exibiram recorde também alumínio e gás natural, assim como percorrem rota ascendente o trigo e o milho. Na avaliação das empresas importadoras, a subida das cotações, no caso do petróleo, levou a diferença entre os preços interno e externo a 25%, o que indica, no Brasil, maior demanda por reajuste nas refinarias da Petrobras, tendo em vista a política de paridade na correção de preços mantida pela estatal.

A exemplo do Brasil, nações dependentes do petróleo e do gás natural russo vislumbram elevações de preços que vão desaguar no frete e, assim, encarecer os alimentos. Isso explica a perspectiva de inflação maior no planeta.

Economistas experientes na formação dos preços consideram que ainda é cedo para avaliar o impacto que o consumidor verá nos preços nas prateleiras. Dependerá da duração do confronto na Ucrânia e da intensidade da elevação dos preços das commodities. Há quem já trabalhe com a expectativa de inflação superior a 6,5% do IPCA, o indicador da inflação oficial do país neste ano. Tempos difíceis.

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