Não poderia ser outra a decisão do pastor Milton Ribeiro, a não ser a de deixar o comando do Ministério da Educação. A permanência dele frente a pasta ficou insustentável depois da sucessão de denúncias de favorecimento de prefeitos apoiados pelos pastores Arilton Moura e Gilmar Santos na distribuição de verbas que deveriam ir para o ensino. A farra com recursos públicos era tamanha, que até a compra de Bíblias entrou nas negociações, e a propina era paga em barras de ouro. O esquema só explicitou o quanto um ministério tão importante para a formação da população e o futuro do país está relegado ao descaso no atual governo. Ribeiro é o quarto ministro da Educação a cair desde o início da administração de Jair Bolsonaro.
Num Brasil carente de educação de qualidade, fundamental para a formação de mão de obra e o aumento da produtividade da economia, é inconcebível que quase quatro anos tenham se passado sem que políticas efetivas de ensino tenham sido implementadas. Nem mesmo durante a pandemia do novo coronavírus, quando se escancararam as desigualdades na educação, com alunos de escolas públicas sem internet para manterem o aprendizado, o ministério se mexeu. Em vez de estender as mãos a professores e estudantes, liderando um movimento nacional, a pasta se manteve focada na agenda de costumes, a ponto de o agora ex-ministro atribuir "a homossexualidade de jovens a lares desajustados".
Ribeiro, infelizmente, não trabalhou em favor do país enquanto esteve no cargo. Preferiu, com sua visão atrasada, manter a educação turvada pelas nuvens do preconceito. Com isso, ao mesmo tempo em que agradava o presidente da República e os extremistas de direita que apoiam o governo, permitia que a corrupção se instalasse com todas as forças no ministério. Agora, terá de responder a dois inquéritos abertos pela Polícia Federal e explicar porque disse em um áudio que o favorecimento liderado pelos pastores tinha o conhecimento e o suporte do chefe do Executivo. Nada pode ficar sem explicação nesse caso escabroso, que enterra o discurso de que os malfeitos foram extirpados da Esplanada dos Ministérios.
O mínimo que se espera, daqui por diante, é que o Ministério da Educação volte para o eixo e passe a cumprir seu papel constitucional. Faltam sete meses para o fim do atual governo, mas é tempo suficiente para que se pavimente um caminho em que estudantes e professores sejam os protagonistas na liberação de verbas, não os amigos do rei, que usam a religião para disfarçar o que realmente são, surrupiadores de dinheiro público. Uma das missões da futura administração deve ser a organização séria do próximo Enem, exame que permite a jovens de baixa renda chegarem aos bancos das universidades. O último teste, que passou pelo crivo de Milton Ribeiro, foi o pior da história, com mais de 50% de abstenção.
Desafios não faltam. Para que o Enem volte a ser uma referência, será preciso reconstruir o Instituto Nacional de Políticas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), que sofreu uma debandada de servidores. Na época, o presidente do órgão, Danilo Dupas, indicado por Ribeiro, foi denunciado por assédio moral e censura, porém, se manteve no cargo. Também será de vital importância priorizar a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), que perdeu mais de 100 pesquisadores. Tudo por conta da ideologia, que não combina com educação séria e de qualidade. Por conta de tantos desastres, o Brasil se afastou do que há de melhor no sistema de ensino. Que a queda de Ribeiro seja o início de uma virada para a racionalidade. A educação merece respeito.
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