Jana Almeida - Professora
Em fevereiro de 2022, uma determinação racista, de uma escola militarizada do DF, pegou de surpresa a família de um aluno negro, uma vez que ele estudava há dois anos no local e nunca tinha sido abordado daquela maneira. Na ocasião, um militar do Corpo de Bombeiro disse para o adolescente cortar o cabelo e ainda fez um comentário de que ele estaria se camuflando com as meninas. Além de tudo, sexista!
Hoje, 21 de março, é o Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial. Lembramos que casos como esse deveriam ser evitados, dentro de casa e, principalmente, nas escolas, se tivéssemos uma educação antirracista. O artigo 1º da Declaração das Nações Unidas sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial diz o seguinte: "Discriminação Racial significa qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada na raça, cor, ascendência, origem étnica ou nacional com a finalidade ou o efeito de impedir ou dificultar o reconhecimento e exercício, em bases de igualdade, aos direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural ou qualquer outra área da vida pública".
No Brasil e, principalmente, no DF, o racismo é nocivo e violento mesmo que, às vezes, soe sutil, apresenta-se de forma velada em mulheres negras. São mais de cinco séculos que o país sustenta um sistema escravocrata. Como professora da rede pública, eu tenho um entendimento de que as novas gerações têm uma visão mais aberta em relação ao tema. As pessoas mudaram, o que falta mudar são as tradições e as ações governamentais. Para conseguir romper o preconceito é preciso investir urgentemente em uma educação antirracista dentro de um plano escolar.
Convido as pessoas a refletirem sobre a construção de trabalhos educativos com cunho antirracista, fazendo algumas indagações no sentido contrário da palavra. Em um país como o Brasil, estruturalmente racista, sexista e classista, não ser racista não é suficiente. Trago para a luta Lélia Gonzales, filósofa e intelectual, que foi nossa pioneira no debate de gênero, raça e classe. Uma mulher negra que vivenciou o racismo e tentou, com muita luta e mobilização social, atravessar esse lugar. Precisamos estudar Lélia e outras como ela.
Djamila Ribeiro, filósofa brasileira, aponta reflexões sobre o racismo, principalmente como uma questão estrutural, trazendo muitas referências a respeito e colocando essa discussão, não no âmbito moral ou individual, mas no lugar de um problema estrutural da sociedade. Ou seja, nascemos num país que sustentou um sistema escravocrata por 300 anos e que, mesmo depois de uma falsa abolição, não deu condição do negro brasileiro construir sua vida com dignidade. O livro Pequeno Manual Antirracistafoi o mais vendido em 2019.
Com a educação antirracista poderemos seguir parte da implementação da Lei 10.639/03, que é o ensino da história e da cultura afro-brasileira e africana e, em seguida, a implementação da Lei 11.465/08, que torna obrigatório o estudo dos povos indígenas nas escolas. Nem de longe, essas leis são suficientes para reparação histórica que esses povos vivenciaram. Mas são políticas compensatórias a todo histórico de injustiça, violência e agressão às culturas negra e indígena. Quando educadores propõem construir uma educação antirracista sabem que não adianta ter pressa, pois enfrentarão complicações e muita resistência para que se realizem de fato. Por que isso é um assunto interessante? É só parar e pensar que a maior parte da população brasileira é negra e indígena, mas não está ocupando os espaços de poder. E ainda mais, cadê as pessoas pretas e indígenas exercendo funções de trabalho que interferem na estrutura social? Onde estão as mulheres negras? Por que nos apagam se somos competentes? O problema é como nos olham, nos marginalizam e nos inferiorizam. Objetificam nossos corpos de uma forma cada vez mais insistente.
Os desafios são muitos! Mas tem como mudar, a partir do momento que nossas atitudes irem ao encontro da luta antirracista. É urgente! É ano de eleição e vocês já verificaram quantas mulheres, pessoas pretas temos na Câmara Legislativa? Precisamos questionar os privilégios dos brancos, defendendo as causas indígenas no trabalho ou no lazer.
Para combater o racismo na infância, primeiro tem de se lembrar que as crianças não nascem odiando o outro por ser negro, e, sim, elas foram ensinadas. A violência começa dentro de casa, reproduzindo atitudes enraizadas, vindas de quem deveria ensinar a amar. A educação de uma criança começa com o adulto se reeducando e entendendo de onde vem todo esse racismo. Basta de mais uma geração crescer aprendendo que ser negro é algo inferior ao branco, que provoca medo, que é suspeito e até ladrão. Além de todas as violências sofridas, sempre é culpado e encarcerado.
As escolas precisam se responsabilizar por ser uma instituição representativa. É preciso ter professores, coordenadores e diretores negros. Depende de nós conversarmos com a criança e respeitar seu entendimento, dando boas referências, se dedicar a não permitir que as crianças associem as negras somente com imagens ruins e violentas.
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