SIDNEY DA SILVA PATRÍCIO - Ex-presidente da Câmara Legislativa do Distrito Federal
Há pouco, o Brasil perdeu Arnaldo Jabor, que, tranquilamente, podemos nominar como um de seus filhos mais aguerridos. Apaixonado pelo país, independentemente de correntes político-ideológicas, ele dedicou mais de meio século de carreira entre o cinema, a tevê e o rádio, célebre por comentários irônicos e cáusticos, bem como seus entusiasmo e inspiração polemistas.
Há pouco mais de uma década, a vida de um cidadão brasiliense — o primeiro presidente da Câmara Legislativa nascido na capital de todos os brasileiros —, se cruzou à do cineasta, jornalista, roteirista, diretor de cinema e tevê, dramaturgo, crítico e escritor. Estávamos sempre acostumados as suas ácidas análises, recheadas de ironia e críticas sociais. Mas sempre voltadas para o cenário político nacional.
Ele nasceu 26 anos antes de eu vir ao mundo. Família de classe média, filho de um oficial da Aeronáutica e de uma dona de casa. Eu, de classe baixa, filho de uma dona de casa e de um mestre de obras. Em 1990, com 50 anos, quando ele migrou do cinema para o jornalismo, migrava eu também da carreira policial para a carreira política, aos 24 anos, com minha primeira incursão política.
Tivemos, na primeira crise institucional da capital da República, o olhar da imprensa nacional. Um escândalo de corrupção retratado, diariamente, nos jornais locais e nacionais expunha nossas vísceras e todo esse sangramento atraia notoriedade. E o gênio esteve lá. Como jornalista, deu voz à indignação dos brasileiros com os descaminhos do Brasil. Como cineasta e escritor, voltou à cidade seu olhar crítico acurado para registrar, em 22 de janeiro de 2010, um episódio rocambolesco envolvendo os principais personagens daquela história que se assemelhava a um filme de terror.
"O filme do panetonegate continua. Suspense, emoção. O juiz Vinícius Santos Silva sentencia, corajosamente: os arrudinhas não podem ser ao mesmo tempo réus e juízes na tal CPI. Seria assim: 'Juiz Arruda, o senhor é culpado?' 'Não, eu estudei muito o processo' e conclui, 'como juiz Arruda, que sou inocente e me absolvo a mim mesmo'. 'E nós, senhor juiz Arrudão?', perguntam os oito anões. 'Ah, Vossas Excelências também estão livres. O que provam, afinal, vídeos mostrando cuecas e meias cheias de grana? Tudo forjado por nossos inimigos'. 'Oba', disseram os anões, 'vamos acabar com a CPI'", contou Jabor, retratando humor ácido os últimos episódios da crise.
Em um minuto e 11 segundos, Arnaldo Jabor narrou, com olhar atento sobre as peculiaridades daquele momento delicado que trazia rubor a Odorico Paraguaçu, em Sucupira, do Bem-Amado, de 1993. "Mas o bravo cabo Patrício, novo presidente da Câmara, berrou: "Desafastem, sem-vergonhas! Vai haver, sim, a CPI do panetonegate. Assim, em breve, não percam, o temido depoimento do Durval Barbosa. A verdade vem aí, e a opinião pública grita, debaixo de porrada dos cavalos do Arrudão: 'Isso, Durval Barbosa, abra seu coração, conte tudo. Entre para a história como um segundo Roberto Jefferson. Coragem, vocês estão acabando com a paralisia do Judiciário'".
A partir dali, seguimos firmes no movimento que pôs fim às especulações infundadas e desonestas pedindo a intervenção federal na capital que não completara nem duas décadas de autonomia política. À medida que avançávamos nas relações institucionais com o Congresso Nacional e o Poder Judiciário, chancelados por Jabor, conseguíamos deixar claro que estávamos tomando medidas enérgicas e efetivas para trazer a cidade de volta à normalidade político-institucional.
Naquela época, a condução do Poder Legislativo, retratada por Jabor, foi de grande relevância na retomada da estabilidade política do DF. Com um comando firme e transparente, num processo isento de apuração de denúncias decorrentes da Operação Caixa de Pandora, seguimos, com rigor, os ritos determinados pelo Regimento Interno da Câmara Legislativa e pela Lei Orgânica do DF. Devolvemos aos brasilienses a normalidade da cidade e asseguramos que a capital não perdesse a autonomia conquistada arduamente há 20 anos por importantes movimentos políticos e populares. E passamos a dividir a história com o gênio dos comentários políticos ora ferinos, ora francamente debochados, mas sempre originais na linguagem.
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