O presidente Jair Bolsonaro tem razão em afirmar que precisamos da paz para que os preços dos combustíveis não subam no Brasil, mas erra ao generalizar. O mundo precisa da paz, antes de tudo, para que vidas sejam poupadas das hostilidades. Quanto ao preço dos combustíveis, eles não necessariamente recuarão com o fim dos conflitos, porque as sanções impostas à Rússia serão mantidas e o país é o terceiro maior produtor mundial, com extração diária de cerca de 10 milhões de barris.
Mesmo sem sanções específicas ao setor de petróleo, a produção russa deve cair por contingências financeiras e logísticas, impactando preços no mercado internacional. A cotação do tipo Brent supera os US$ 100 por barril no mar do Norte, contra US$ 77,78 em 31 de dezembro de 2021, um aumento de 28%. A perdurarem essas cotações, a Petrobras terá de reajustar os preços do diesel e da gasolina, seguindo a política de paridade de preços que leva em conta ainda o dólar, que inverteu a tendência de queda e deve continuar em alta.
Nesse contexto, será preciso mais para que o Brasil não sofra com as pressões de preços no mercado internacional e os brasileiros não vejam o litro da gasolina encostar em R$ 10. Mais uma vez, é preciso que se insista na necessidade de uma solução estrutural para o valor dos combustíveis no mercado brasileiro. O governo pretende reduzir impostos sobre os combustíveis e aposta em projetos no Congresso que vão no mesmo sentido, cortando tributos federais e estaduais. Esses cortes têm efeito limitado diante de uma perspectiva de preços crescentes do petróleo no mercado internacional e podem ser anulados rapidamente caso a cotação do barril chegue a US$ 120 ou mesmo US$ 150, o que não é descartado hoje.
Corte de impostos significa redução de recursos na União e nos estados, sendo que, nas finanças estaduais, o impacto é mais significativo, principalmente considerando que o Planalto já cortou em até 25% o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), com queda na arrecadação de recursos que têm que ser divididos com os estados. Ou seja, chamou os entes federados para participar da bonança em ano eleitoral. É preciso considerar ainda que redução de impostos federais pode levar ao aumento da dívida pública.
Na conjuntura atual de escalada de preços do petróleo e desvalorização do real, que levaram a Petrobras a um lucro recorde de R$ 106,7 bilhões, é necessário considerar que os acionistas continuem usufruindo da eficiência da petrolífera brasileira, mas que, para isso, não só brasileiros sejam apenas punidos com combustíveis mais caros nos postos de abastecimento.
Com o resultado da estatal, o governo federal, como acionista majoritário, vai receber R$ 37,3 bilhões em dividendos, dinheiro suficiente para a constituição de uma conta de estabilização de preços, incorporada ao projeto de lei que muda a política de preço dos combustíveis, em discussão no Congresso Nacional. Esse fundo pode contar ainda com parte dos R$ 202,9 bilhões pagos em impostos pela estatal do petróleo no ano passado.
A conta de compensação, ou fundo de estabilização, é um mecanismo que permite reduzir a necessidade de reajustes dos combustíveis em curto espaço de tempo e é retroalimentado pelos resultados positivos da petrolífera, não significando, portanto, interferência nos preços da estatal ou na receita de estados. É obrigação do governo minimizar para os brasileiros os impactos de uma guerra travada a milhares de quilômetros de distância.
Desejar a paz é exigência humana, enquanto ações para equacionar o problema dos preços dos combustíveis carecem de atitudes concretas. E nunca é demais lembrar que a Petrobras é fruto de investimentos, tecnologia e esforços brasileiros, num processo iniciado no fim da década de 1940 com a campanha "O petróleo é nosso".
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