Que lugar ocupar no mundo, quando tudo desmorona? A máscara protege contra a peste, mas também camufla intenções. Sem saída à esquerda ou à direita, pois, agora, os comunistas se uniram à extrema insensatez — é tudo demagogia e disputa por poder. Uma hecatombe diária aflige a Terra, guerras e um estado permanente de tragédia, para os quais não se encontram respostas. Apenas em sonho um possível caminho se apresentaria, mas o mundo segue insone, levado pela insanidade de trabalhos e impostos, enquanto procura algum prazer que não devaste o espírito. Se eu pudesse, viajava para Natal ou renascia.
Os garimpeiros querem ouro e arrasam a floresta. Vasculham as profundezas do solo, não respeitam planta nem raiz. Um cronista cínico e senil defende o falso progresso. Com certeza, os corpos sujos de lama desconhecem o banho numa queda de cachoeira. Os conservadores reivindicam a purificação da alma, mas patrocinam a destruição da vida e alimentam o tráfico de armas. Seria tão mais suave se os cantores e dançarinos da Vila Madalena ambicionassem o poder para nos curar as feridas.
Os discursos políticos proferem incontáveis mentiras, com velhos personagens a inebriar fiéis seguidores, em redes repletas de ódio e preconceitos. Sobra dinheiro para campanhas eleitorais, mas faltam recursos para a educação das crianças e comida no prato de uma nação de famintos.
Talvez, o silêncio e a distância entre os amantes sejam as causas do caos. Se houvesse perdão, se não existisse pecado, a beleza triunfaria. Mas a cegueira deixada como herança polui os corações e mentes de gerações futuras e presentes. Reconhecer as origens do mal pode iluminar uma trilha que conduza ao bem-estar.
Haveria esperança de redenção se as editorias de arte dissertassem mais sobre jazz e os filmes de Jabor em vez do reality show que parece conto de terror — as trevas ainda não dominam, mas estão chegando lá.
Meu avô só me deixou fé, uma enxada e um mau-humor desgraçado. Jamais ganhei carrão importado para exibir no Instagram. A rainha da soja ostenta joias, marido e rifles. Visitou a tribo indígena, tirou uma foto e acredita na Justiça.
Este ano tem eleições e Copa do Mundo — a derrota é quase certa nas duas. Ao menos a cachaça não está tão cara quanto a gasolina. Se não dá para pegar a estrada, melhor flutuar em ébrios pensamentos sob as luzes da rua.
Vagando em busca pelo sorriso de Mona Lisa, transcorre a madrugada com letras de sentido incerto. A cabeça pesa e pede descanso — a saúde mental está na moda, uma prioridade ignorada pelos patrões. A guitarra de Pepeu inspira um novo amanhecer. A cultura resiste às investidas dessa gente bárbara, mas a melhor balada da cidade fechou as portas. Tempos difíceis, meu amor...