Petróleo

Claudio Mastella: Livre mercado e concorrência no setor de combustíveis

Claudio Mastella - Diretor executivo de Comercialização e Logística da Petrobras

No Brasil, o setor de combustíveis é baseado em princípios de livre mercado. Isso não é novidade. Embora ainda haja equívocos sobre o papel da Petrobras e da União no suprimento e na definição de preços de combustíveis, a legislação que define o modelo de livre concorrência data de 1997. Há quase 25 anos, com a Lei do Petróleo, o país — por meio dos poderes Executivo e Legislativo — decidiu pelo fim do monopólio da Petrobras.

A Lei do Petróleo permitiu que a União licitasse a concessão de áreas petrolíferas, colocando a Petrobras em igualdade de condições com outras empresas. Mais atores investindo ajudaram a alavancar a produção de petróleo, com retorno direto para o Estado por meio de tributos, empregos e menor dependência externa. E isso ocorreu porque, na comercialização interna e externa do petróleo produzido no país, os preços foram sempre atrelados ao mercado internacional. Também estabeleceu o fim da autorização legal para que a União ditasse reajustes dos derivados. E definiu que, a partir de 1º de janeiro de 2002, os preços passariam a ser formados livremente em todas as etapas da comercialização pelos diferentes agentes de mercado, com liberdade de importação e exportação.

Derivados de petróleo são commodities, assim como a soja, a carne, o café e outros. A comercialização desses produtos é conectada no mundo inteiro, com uma interdependência global entre regiões produtoras e consumidoras. Os preços locais são influenciados pelas alternativas de compra e de venda dos agentes, convergindo para o equilíbrio do balanço de oferta e demanda em um mercado global. Quando há alta demanda, os preços tendem a aumentar. Quando há aumento da oferta ou queda da demanda, tendem a cair.

Observamos isso recentemente. Em 2020, com o impacto da covid-19, o petróleo tipo Brent chegou a ser comercializado a menos de US$ 15/barril e a Petrobras vendeu gasolina para as distribuidoras ao preço médio de R$ 0,91/litro. Com o aumento da demanda, o barril de Brent chegou a US$ 86 em 2021, com reflexos no preço dos combustíveis — que até chegarem ao consumidor, têm somadas ao preço de venda nas refinarias parcelas que podem dobrar ou até triplicar seu valor, como custos e margens de distribuição, da mistura obrigatória de etanol na gasolina e de biodiesel no diesel, além dos impostos.

O que muita gente não sabe é que, mesmo sendo um produtor relevante de petróleo, detentor de algumas das maiores reservas em águas profundas no mundo, o Brasil precisa importar derivados. Em 2021, a Petrobras foi responsável por cerca de 80% da oferta de gasolina e diesel no mercado brasileiro e 20% foram atendidos por empresas que, atuando em livre concorrência, produzem ou importam combustíveis pautadas por decisões baseadas na economicidade.

Deve-se considerar também que a Petrobras faz uma robusta gestão de seu portfólio e segue programa de desinvestimentos, conforme compromisso celebrado com o Cade e em linha com as diretrizes do Ministério de Minas e Energia e do Conselho Nacional de Política Energética. Em 2021, foi concluída a venda da refinaria Landulpho Alves, na Bahia, trazendo mais um ator relevante para competir no mercado brasileiro. Nesse contexto, preços artificialmente desconectados do mercado global podem ter consequências danosas. Os efeitos de preços artificialmente baixos, sem a devida compensação econômica, vão além das questões legais, podendo resultar em falta de investimentos e potencial desabastecimento. No curto prazo, sem preços competitivos, importadores e outros refinadores poderiam deixar de atuar, gerando risco de não atendimento de parte da demanda.

Haveria consequências negativas também no longo prazo. O refino demanda investimentos elevados para seguir atendendo à demanda. Se uma empresa acumula prejuízos com preços abaixo de seus concorrentes, não terá capacidade de investir e deixará de atender à sua parcela da demanda. Outras empresas também não investirão, pois um mercado desalinhado à dinâmica global afugenta investidores.

Não à toa, mesmo com o mercado legalmente aberto desde 1997, não se viu no refino a mesma evolução e pujança que observamos na produção de petróleo e gás. No passado, a política de preços da Petrobras, pouco clara no acompanhamento das mudanças de patamar dos preços internacionais, resultou na falta de interesse de outros atores em importar combustíveis e investir no refino nacional.

Sem investimentos, o risco de desabastecimento é real — como já se viu ocorrer em outros países que, mesmo com relevantes reservas de petróleo, enfrentam dificuldades crônicas para abastecer seu mercado interno. Também não há mais espaço para praticar preços acima do mercado, pois isso aumentaria rapidamente as importações, forçando as refinarias nacionais a reduzirem a produção. E isso não acontece atualmente. Com preços alinhados à dinâmica internacional, o que se observa, hoje, é a Petrobras e outros agentes compartilhando riscos e oportunidades na importação de combustíveis e no atendimento ao mercado.

Considere-se ainda que, além da Lei do Petróleo, aplica-se à Petrobras também a Lei das S/A e, desde 2016, a Lei das Estatais, que afirma que as empresas de economia mista só podem assumir condições distintas de outra empresa privada caso haja definição clara em lei ou regulamento. Portanto, no atual arcabouço legal, a atuação da Petrobras deve ser em livre competição.

Assim, em respeito à legislação e às suas responsabilidades como empresa de economia mista, a Petrobras pratica preços atrelados ao mercado, de forma responsável, evitando repassar aos clientes a volatilidade de curto prazo do mercado internacional. A companhia segue compromissada com a eficiência e com a entrega de produtos de alta qualidade aos seus clientes, a preços competitivos, contribuindo assim para o abastecimento nacional e para a robustez de nosso mercado, com resultados positivos para a sociedade brasileira.