A tragédia de Petrópolis dói na alma e no coração e confirma o sentimento de que falhamos como sociedade civil organizada. Ver cenas de familiares desesperados cavando a terra em busca de parentes desaparecidos emociona. E o pior é a constatação de que essas mortes, que já passam de uma centena, têm classe social. Atingem, principalmente, as pessoas desamparadas pelo poder público.
É sabido que estamos no meio de um processo de mudança climática. Cientistas alertam há tempos que as intempéries serão cada vez mais extremas e frequentes. E o que vemos aqui, como nos mostra a pandemia do novo coronavírus, é exatamente a negação da ciência e da pesquisa. Temo, assim, que as tempestades e enchentes que matam dezenas de pessoas comecem a se normalizar no país e se tornem mais um daqueles absurdos do dia a dia, como a violência urbana, que virou rotina na sociedade.
Entristece relembrar que o que ocorreu em Petrópolis na terça-feira é recorrente. Somente este ano tivemos situações semelhantes na Bahia, em Minas e no Espírito Santo. Voltando um pouco mais no tempo, os desastres ocorridos no deslizamento do Morro do Bumba, em 2010, em Niterói, e na Região Serrana do Rio, em 2011, seguem na nossa memória coletiva. E muito pouco foi feito para evitar que ocorram normalmente.
A ocupação urbana desordenada segue a pleno vapor. Combater invasões e construção de moradias em áreas de risco não rende voto. Pelo contrário, faz é perder eleitorado. Quem é retirado de um local costuma fazer juras de nunca mais votar em tal político. Sempre de olho na reeleição, a classe política posterga ao máximo a adoção de medidas impopulares — o que no caso da ocupação urbana é para sempre. É mais fácil ter a reconstrução da área afetada como ela estava antes da tragédia do que evitar que pessoas voltem a morar ali novamente.
Então, uma pergunta segue constante: o que fazer? O certo seria uma ação coordenada de várias setores da sociedade civil para retirar moradores de áreas impróprias para moradia. Uma atuação conjunta de órgãos públicos e entidades privadas, como a OAB para discutir questões legais e ONGs para o suporte assistencial, seria fundamental. A chance de ocorrer? Zero. Temos casos isolados em uma ou outra cidade. E nada mais.