Crise na Ucrânia

Visto, lido e ouvido: Ninguém tem razão

Circe Cunha
postado em 23/02/2022 06:00
 (crédito: Getty Images)
(crédito: Getty Images)

Manchetes dos principais jornais nacionais e do mundo amanheceram estampando destaques que alertam para o perigo de uma guerra, de sérias proporções, envolvendo a Rússia e a Ucrânia, no Leste da Europa. Num mundo absolutamente globalizado, possíveis conflitos dessas proporções ameaçam todos, tanto pelas consequências econômicas, humanitárias e políticas geradas, quanto pelos efeitos em cadeia que as guerras acabam gerando.

Caso venha a acontecer, de uma forma ou de outra, sentiremos os efeitos desse embate. Não bastassem as consequências danosas da pandemia da covid-19, e dos impactos, cada vez mais sentidos, das mudanças climáticas e de uma previsível recessão econômica, que muitos analistas apontam no horizonte, uma guerra de grandes proporções, neste momento, abalando boa parte do Leste europeu, pode, com facilidade, levar-nos a uma situação de imenso perigo, com ameaça, inclusive, à sobrevivência da espécie humana.

Os esforços feitos por lideranças europeias para distensionar o ambiente, ao que parece, não têm dado resultados. É sabido que, em guerras, a primeira vítima sempre é a verdade, o que explica a multiplicação de versões, de lado a lado, sobre o desenrolar dos fatos. Em casos de conflito, a tendência do ser humano é sempre buscar informações que levem, não apenas à compreensão dos fatos, mas, sobretudo, a uma tomada de posição contra ou a favor de um dos lados.

A situação ganha um complicador quando se entende que, nesse caso específico, ambos os lados têm suas razões, sendo que a nenhum deles é garantido a razão plena. Como dizia o filósofo austríaco Karl Popper (1902/1994): "Se são dois que estão errados, isso não quer dizer que os dois tenham razão, pois admitir que o outro possa ter razão não nos protege contra um outro perigo: de acreditar que todos talvez tenham razão".

O fato aqui é que, mais uma vez, em sua longa história, a Ucrânia vê seu território sendo espremido e invadido por potências estrangeiras. No caso atual, o povo ucraniano está no meio do tiroteio entre a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), com os Estados Unidos à frente e a belicosa Rússia. Correndo por fora desse conflito estão as grandes indústrias de armamento, que fornecem para esse cenário os meios materiais para que tudo ocorra.

A Otan, que deveria deixar de existir, tão logo teve fim o império soviético, vem sobrevivendo ao término do Pacto de Varsóvia, embora tenha perdido sua razão de ser. Há ainda o tal do determinismo geográfico, que faz com que a Ucrânia, por sua proximidade física com a Rússia e passado histórico e cultural comuns, encontre dificuldades enormes em se libertar de Moscou.

O razoável — se é que se pode falar em razoabilidade em conflitos armados — seria a transformação da Ucrânia em área neutra, a exemplo do que ocorre com a Suíça, livre da influência das duas grandes potências atômicas. Mas essa é uma medida que parece não interessar nem a Putin nem aos Estados Unidos, muito menos às indústrias de armamento, que estão na expectativa de grandes lucros com a eclosão dessa escaramuça.

Em meio a esses verdadeiros senhores da guerra, está a sociedade civil ucraniana, constituída por mais de 40 milhões de homens, mulheres, crianças e idosos, que terá de partir para outras partes ou morrer debaixo das bombas. Os únicos que parecem ter razão nesse conflito são aqueles que não desejam esse embate, mas que, por isso mesmo, não são levados em conta.

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