Na abertura do ano Legislativo, na última quarta-feira (2/2), o presidente Jair Bolsonaro falou em liberdade de imprensa. Juntou na mesma frase um conceito que despreza (liberdade) e uma instituição que detesta (imprensa). Foi uma esperteza para colocar, em um só prato da balança, o jornalismo sério e profissional ao lado dos pistoleiros de redes sociais e de veículos obscuros, que se dedicam ao exercício diário de pensar barbaridades, sem qualquer conexão com a realidade, para divulgá-las como se informações fossem.
A suposta defesa da liberdade que Bolsonaro faz é somente o preâmbulo para uma campanha feroz e desonesta que ganhará tração, nas próximas semanas, contra o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A Corte tocou num instrumento sensível da máquina bolsonarista de desinformação: o aplicativo de mensagens Telegram. Foi para ali que o submundo da extrema direita migrou, depois que o WhatsApp decidiu colaborar com o TSE, antevendo que tinha muito a perder se continuasse se permitindo ser zona franca da mentira.
De que maneira o tribunal agirá contra o Telegram é uma incógnita, pois seus servidores estão bem longe daqui — ficam na Rússia, acusada de ser a pátria dos piratas da internet e dos seres que infestam a dark web. Mas, com a vigilância prometida contra as fake news no período eleitoral, é de se calcular que alguma ação será tomada.
Bolsonaro entoa o bordão da liberdade com se dela fosse um grande defensor. Liberdade, para ele, é sinônimo de balbúrdia, de ausência de regras, de desrespeito e de incivilidade. A última coisa que deseja é que exista alguma barreira que o impossibilite de assacar contra a honra de seus adversários na corrida eleitoral, inventando, distorcendo, exagerando e montando falsidades. Se elegeu, em grande parte, pilotando um projeto no qual pouco importava a honestidade de propósitos. Com o ódio de então ao PT, foi fácil trabalhar a inverdade para conquistar votos.
E pretende repetir a dose este ano. Por isso, reage tanto às barreiras que o TSE começa a erguer. Dias atrás, em nome novamente dessa "liberdade", disse que as balisas ao WhatsApp eram uma "covardia". Por que? Bolsonaro quer potencializar o impacto dos truques sujos por meio da máquina estatal.
Na noite da última quarta-feira, ele prestou apoio a Joe Rogan, um preconceituoso, racista e irresponsável que usa o podcast abrigado no serviço de streaming Spotfy para disseminar todo tipo de estupidez, sobretudo contra as vacinas para a covid-19. Tuitou isso: " I'm not sure what @joerogan thinks about me or about my government, but it doesn't matter. If freedom of speech means anything, it means that people should be free to say what they think, no matter if they agree or disagree with us. Stand your ground! Hugs from Brazil".
"Se liberdade de expressão significa algo, quer dizer que as pessoas são livres para dizer o que pensam, mesmo que concordem ou discordem de nós", escreveu. Perfeito, mas não é o que Bolsonaro quer. Ele deseja abusar da liberdade para disseminar falsidades e teorias caóticas capazes de matar, disseminar o ódio e aprofundar divisões.
Agir contra isso não é censura. É defender a civilização.
Saiba Mais
Notícias pelo celular
Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.
Dê a sua opinião
O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.