Dezembros de anos nublados como este, em que vivenciamos tantas perdas, frustrações e amarguras de uma pandemia, não são propriamente um convite à alegria. Seria quase um acinte eu insistir pelo sol quando o mais divertido dos amigos segue na penumbra da inconsciência, um duro momento para nós também, que, ao seu lado, seguimos num cortejo de risadas pela vida afora.
Se consciente estivesse, certamente o amigo que compartilha comigo a paixão pelo glorioso Santa Cruz, time da série D, dono de um bom humor contagiante, estaria me ligando para falar coisas leves e levantar meu astral. Ia me contar uma piada ou talvez me pedir para contar a última piada da vida para ele. Mas meu conterrâneo tricolor não está ON e talvez não esteja mais... A vida, esta piada pronta, é breve e não passa leve para muita gente. Mas, para ele, é leve e talvez sempre seja.
É assim também para mim, mas confesso que, nesses duros tempos, até quem tem personalidade de animador de festa e se assume como um otimista incorrigível, correndo o risco de parecer uma Poliana idiotizada, sente a tristeza contagiar.
Voltamos, então, às técnicas de sobrevivência: ver boas comédias inglesas, séries de besteirol pela TV, entrevistas antológicas de Dercy Gonçalves, programas do Jô (Soares), Chico (City) Anysio, Porta dos Fundos, tiradas de humor cortante dos cearenses, baixarias do humor pé sujo do Tik Tok. Nem sempre funcionam, mas a gente tenta. É questão de temperamento. Quem tem alma alegre sofre por não estar assim sempre. Não são sou prisioneira da alegria, mas o humor corre nas veias — nas minhas e nas do meu amigo.
Talvez, por isso, uma espécie de crônica de Natal foi escrita em sonho. Como o aviso de que gente assim não cai morto; cai rindo. A poucos dias do Natal, minha mãe me visitou enquanto eu dormia e leu para mim a oração de São Thomas More chamada Oração do Bom Humor.
Diz assim: "Senhor, dai-me uma boa digestão, mas também algo para digerir/Dai-me a saúde do corpo, mas também o bom humor, necessário para mantê-la/Dai-me, Senhor, uma alma simples, que saiba aproveitar tudo o que é bom e que não se assuste quando o mal chegar, e sim que encontre a maneira de colocar as coisas no lugar/Dai-me uma alma que não conheça o tédio/nem os resmungos, suspiros e lamentos, e não permitais que eu me atormente demais com essa coisa incômoda demais chamada "eu"/Dai-me, Senhor, senso de humor!".
O que isso quer dizer? Sabemos muito pouco sobre os mistérios da vida e da morte. E, na hora daquele pico de hipertensão, em que o coração parece sair pela boca, a diferença entre o fim e o recomeço de fato é ínfima. Uma hora, o "eu" se dissolve, pois vamos todos para algum lugar que pouco conhecemos. Ir com alegria e espírito leve é o melhor que podemos fazer.