Por Marcos Camargo - Presidente da Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais (APCF)
"Nos detalhes estão verdades que fazem justiça." Essa é uma das colocações que define muito bem o trabalho pericial, que tem a ciência como ferramenta de prova destinada à elucidação de crimes e à preservação das garantias individuais e direitos fundamentais dos cidadãos. Nesta Semana do Perito Criminal, iniciada no sábado, cabe a reflexão sobre a importância da perícia para o aprimoramento da segurança pública brasileira e a defesa dos direitos humanos.
É por meio da análise científica dos vestígios que os peritos criminais produzem a prova material, que carreia aos autos elementos qualificados para se comprovar a veracidade dos fatos. Pelo trabalho pericial, consolida-se o direito constitucional à prova, essencial para o exercício da ampla defesa e do contraditório, que objetivam garantir o julgamento justo do processo penal.
Para salvaguardar a atuação da perícia criminal, o Código de Processo Penal (CPP) determina, sob pena de nulidade processual, a indispensabilidade da atuação dos peritos criminais nos crimes que deixam vestígios. A Lei n° 12.030/2009 também confere autonomia técnica, científica e funcional para o desempenho das funções, subordinando os profissionais apenas à ciência.
Essas medidas são importantes, porque o processo penal é caracterizado pela incerteza, demandando durante seu curso a busca da verdade, a garantia aos direitos individuais e a presunção da inocência. É por meio da sua natureza probatória que será afiançada a idoneidade da persecução penal, motivo pelo qual a robustez das provas não deve deixar dúvidas quanto à existência do crime e da autoria.
Além disso, cabe aos peritos criminais a missão de gerir a cadeia de custódia, base dos princípios da igualdade e da desconfiança que regem o processo penal brasileiro: o primeiro, asseverando que o encontrado no local de crime é o mesmo utilizado para decisão judicial; o segundo, lastreado pelo fato de que não há confiança preestabelecida, remetendo todas as partes à prova e à sua credibilidade. Assim, torna-se cada vez mais necessária a valorização da cadeia de custódia, sendo que sua falta poderá levar a grave prejuízo quanto à demonstração ou à impugnação dos elementos informativos, tornando ilícita a prova ante a impossibilidade de contraditá-la.
Em qualquer democracia, é essencial o pleno desenvolvimento da estrutura de perícia criminal. Em um país com grandes desigualdades como o nosso, essa missão é ainda mais necessária. Atualmente, o Congresso Nacional discute uma reforma do CPP. É preciso que a sociedade permaneça vigilante para que nenhuma flexibilização sobre o conteúdo probatório venha a ser promovida, a fim de se evitar um sistema que traga mais desigualdades, impunidade e injustiças.
É necessário registrar que, apesar de alguns avanços importantes, a maior parte das ações de desenvolvimento de políticas públicas tem relegado a participação científica a um segundo plano. É essencial uma participação cada vez maior, nas ações decisórias, dos peritos criminais, carreira que detém expertise e competência legal para a fusão entre ciência e segurança pública.
A criação de uma Secretaria Nacional de Ciência Forense é uma importante medida para o aprimoramento de ações de prevenção e de combate à criminalidade, de forma a reduzir a impunidade e mitigar injustiças. Caberia à estrutura priorizar especificamente a atuação científica para a área de segurança por meio de uma coordenação central que atuaria, entre outras medidas, na padronização nacional de procedimentos operacionais e de cadeia de custódia, no intercâmbio de informações entre instituições, na integração de bancos de dados e na capacitação contínua de profissionais.
Sob o ponto de vista específico da segurança pública, o Estado não deve se impor em relação ao crime apenas com base no monopólio do exercício legítimo de coação, mas deve se impor sobretudo na ciência. Isso é um fator que impede o abuso de poder. Nesse contexto, o valoroso trabalho exercido pelos peritos criminais é, e sempre será, imprescindível.