ARMANDO CASTELAR - Economista, coordenador de economia aplicada do Ibre/FGV
O mercado financeiro parece ter convergido para um cenário para a economia brasileira em 2022 que, infelizmente, é não mais que medíocre. A atividade econômica deve seguir estagnada, com as previsões oscilando entre uma pequena queda (-0,5%) e uma ligeira alta ( 0,7%) do PIB. A agropecuária deve ter um bom desempenho, se recuperando da queda de 2021, e os serviços também devem ter um desempenho positivo, conforme se avance no controle da pandemia. A indústria de transformação, por seu lado, deve registrar forte contração, ainda que em parte refletindo o péssimo desempenho do segundo semestre de 2021 e o consequente carregamento estatístico negativo.
Pelo lado da demanda, o investimento se deve contrair e o consumo das famílias desacelerar, enquanto o consumo do governo deve subir mais fortemente. Taxas de juros mais altas, queda da renda real das famílias e elevada incerteza vão impedir uma expansão mais robusta da demanda privada. Por seu lado, com a demanda doméstica estagnada, o crescimento mundial ainda alto e a taxa de câmbio bastante desvalorizada, a demanda externa deve crescer, revertendo a queda deste ano.
A inflação deve cair, mas para uma taxa ainda alta, entre 5% e 6%. Essa queda seria puxada por tarifas de eletricidade mais baixas e preços de alimentos e gasolina relativamente estáveis ou, no pior dos casos, com altas bem inferiores às registradas em 2021. Esses três itens responderam por 57% da inflação de 2021. Naturalmente, essas projeções dependem de não se repetir a seca que tivemos este ano.
Por seu lado, os preços de serviços, que subiram abaixo da média em 2020-21, vão voltar a pressionar a inflação. A grande incógnita seriam os preços de bens industriais: se espera que eles tenham alta mais moderada, conforme as cadeias de suprimento e a demanda internacional por esses bens se normalizem, mas essa não é uma certeza.
Dado esse cenário base, há três temas principais que podem levar a um quadro razoavelmente distinto. O primeiro é a pandemia. O cenário central com que trabalha o mercado é que a variante ômicron terá impacto apenas moderado sobre a atividade econômica e que esse não se estenderá por muito tempo. Isso pela visão de que, com a vacinação abrangente da população, será possível evitar repercussões mais sérias sobre a saúde e, consequentemente, a necessidade de interromper o funcionamento da economia. Se essa premissa não se confirmar, podemos ter um cenário bem mais negativo em termos de atividade econômica, desemprego e contas públicas.
O segundo tema é a inflação, no mundo e, em especial, nos países ricos. Eles, como o Brasil, reagiram à pandemia com estímulos fiscais e monetários muito fortes, o que, em 2021, se refletiu na inflação, que nos países desenvolvidos foi a mais alta em décadas. Os bancos centrais desses países resistiram a alterar a política monetária muito expansionista que vinham adotando, argumentando que a inflação alta resultava de choques "transitórios", e que ela cairia logo e sozinha.
Esse discurso foi agora abandonado, mas o cenário central segue sendo de uma política monetária expansionista, ainda que menos do que no último par de anos. Nos EUA, a expetativa é de que em março o Fed, o banco central americano, pare de emitir moeda para comprar títulos públicos, começando a subir a taxa de juros em junho. Ao todo, seriam três altas em 2022, o que levaria os juros para pouco menos de 1% ao ano. Esse processo vai pressionar a taxa de câmbio e o risco país dos emergentes, mas de forma moderada e já bastante antecipada. Porém se a inflação americana surpreender para cima, os juros podem subir mais, colocando maior pressão sobre os emergentes.
Por fim, teremos as nossas eleições. A visão central é de que só em meados de 2022 se terá um cenário eleitoral mais claro, o que tem limitado as discussões sobre a política econômica que virá a partir de 2023. Hoje se trabalha com a premissa de que ela mudará pouco. Mas esse quadro pode se alterar conforme as eleições se aproximem, impactando o preço dos ativos brasileiros e, em especial, a taxa de câmbio. O cenário base é de que ela permanecerá estável, ou até apreciará um pouco, por conta da Selic mais alta; mas, dependendo do cenário político-eleitoral, pode haver uma nova rodada de desvalorização do real, jogando nossa inflação mais para cima. Tudo isso sugere que, além de pouco animador, o cenário de 2022 pode ser muito volátil. Que o ano seja, porém, muito bom para todos nós.
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