Em 2021, pelo menos 44 jornalistas foram assassinados no mundo. Outros sofreram ataques e desapareceram. Muitos se viram alvos de intimidação e de ameaças. Ou foram execrados e humilhados por aqueles que, ante o poder emprestado pelo povo, julgam-se acima de tudo e de todos. A filipina Maria Ressa e o russo Dmitry Muratov jamais esmoreceram na busca pela verdade e na confrontação ao autoritarismo. Carregam, dentro de si, a chama da luta pela democracia e do Estado de direito. Ressa expôs a guerra ao narcotráfico lançada pelo presidente das Filipinas, Rodrigo Duterte, que usou milicianos para executar traficantes e usuários de drogas. Muratov denunciou os assassinatos de seis colegas jornalistas que publicaram reportagens críticas ao presidente da Rússia, Vladimir Putin. Depois de amanhã, os dois receberão, em Oslo, o Nobel da Paz, uma das mais altas honrarias.
Tive a sorte e a honra de entrevistar ambos. O contato com Muratov foi por meio do WhatsApp. Com Ressa, em uma exclusiva via Zoom — software de videoconferência — que durou 27 minutos. O russo dedicou o prêmio a Igor Domnikov, Yuri Domnikov, Yuri Shchekochikhin, Anna Politkovskaya, Anastasia Baburova, Stanislav Markelov e Natalia Estemirova, colegas em seu diário Novaya Gazeta. "O mérito é deles. Eles desafiaram o mal e a corrupção com o seu trabalho destemido", afirmou Muratov. No olhar, a filipina transpareceu coragem e paixão pelo jornalismo. Atacou as fake news, criticou o autoritarismo e enviou um recado aos adeptos do pseudojornalismo disseminado pelo WhatsApp: "O jornalismo sempre estará aí, porque é a coragem de falar a verdade ao poder".
Na sexta-feira, quando Muratov e Ressa receberem o diploma e a medalha do Nobel, milhares de jornalistas mundo afora estarão representados em Oslo. E líderes autoritários — que mandam repórteres calarem a boca ou perguntam se a mãe de um jornalista passou recibo para o pai na zona — terão de lidar com o fato de que a verdade dói: eles precisam prestar contas ao povo; e será a imprensa que os fiscalizará. Escolhi a profissão de jornalista em 1993. Não me arrependo. Acredito no jornalismo como a busca pela justiça social e pelos fatos que constroem uma nação. O jornalismo é testemunha da história, mas também agente de transformação. Se queremos um mundo sem corrupção, sem trogloditas no poder e sem mazelas sociais, precisamos apostar na imprensa. Precisamos valorizar a verdade e combater as fake news, tóxicas e avassaladoras. Precisamos confrontar quem confronta a democracia. Por Dmitry Muratov e por Maria Ressa. Pelos jornalistas mortos. Mas também por nós.
Saiba Mais
Notícias pelo celular
Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.
Dê a sua opinião
O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.