Editorial

Uma política efetiva de preços

"O petróleo é nosso." Se esse slogan entoado em meados do século passado levou à criação da Petróleo Brasileiro S.A e ao desenvolvimento de toda uma indústria petrolífera reconhecida mundialmente pela exploração de óleo em águas profundas, hoje é preciso avançar. Com os aumentos sucessivos dos derivados do petróleo, como gasolina, diesel e gás de cozinha, que já superam os 50% este ano, impondo um custo alto não apenas para motoristas, mas para toda a sociedade, que, depois de vários anos, volta a temer o descontrole inflacionário.

Mais do que enxergar na maior empresa brasileira problemas e sugerir a privatização apenas como uma forma de se livrar da responsabilidade pela política de preços da estatal ou enxergar como natural os aumentos porque eles decorrem de uma inflação mundial, o governo tem a obrigação e o dever de agir como regulador de uma atividade essencial para a economia. E isso independe de a empresa ser ou não estatal. A empresa pode ficar exposta às oscilações de preços, o país não.

Cabe perguntar se a estatal que era vista como um problema, agora, depois de anunciar seu plano de investimentos para quinquênio 2022-2026, com aporte de US$ 68 bilhões, ou algo perto de R$ 374 bilhões ao câmbio de R$ 5,50, passa a ser fator positivo para a economia brasileira. É de longe o maior programa de investimentos de uma empresa no país, e esses recursos vão alavancar toda a cadeia do petróleo e gerar empregos. Sozinha, a empresa pode fazer mais pela geração de vagas de trabalho do que tem feito o governo inteiro.

É preciso ficar claro que o problema do aumento do valor dos combustíveis não é a Petrobras, mas, sim, a passividade do governo, que faz vistas grossas à possibilidade de mudar a política de preços sem intervir na estatal e desagradar o mercado financeiro, que não tem carro para abastecer e nem fogão a gás. Política de preços é, por exemplo, constituir um fundo para amortizar a necessidade de reajustar os valores dos combustíveis. E esse fundo pode ser estabelecido a partir dos dividendos pagos ao governo e que, a partir de agora, serão distribuídos trimestralmente.

Essa medida não é intervenção em preços, é estabelecimento de condições para que se tenha uma política de preços que não seja apenas favorável à empresa e seus acionistas, mas atenda ao conjunto da sociedade e aos interesses estratégicos do país. Foi assim que agiu os Estados Unidos ao fixar, na década de 1970, a criação de estoques estratégicos de petróleo diante do embargo dos países produtores reunidos na Opep. Agora, com o barril de petróleo do tipo brent na casa dos US$ 80, esparramando inflação pelo planeta, o governo do presidente Joe Biden anuncia a possibilidade de liberar 50 milhões de barris das reservas estratégicas do EUA, compostas de 700 milhões de barris.

Ao tomar essa medida, o presidente dos Estados Unidos não está intervindo no preço de nenhuma das empresas que vendem combustíveis por lá, mas, sim, agindo como presidente para evitar que uma estratégia definida pela Rússia e os países árabes — que postergam o aumento da oferta — seja responsável pela elevação do custo de vida dos norte-americanos. É esse tipo de política que se espera do governo brasileiro neste momento, para que toda a sociedade — e é preciso frisar que é toda a sociedade — seja menos penalizada. É uma distorção tratar o aumento dos combustíveis responsabilizando outros agentes ou adotando medidas pontuais como auxílio para caminhoneiros abastecerem. Mas e o auxílio para milhares de brasileiros que precisam dos veículos para trabalhar? Se há 50 anos era preciso dizer que "o petróleo é nosso", agora, é preciso agir para que a "política dos preços do petróleo" seja nossa.