Quem vai ao supermercado tem a exata noção de como o custo de vida disparou no Brasil. Não por acaso, pela primeira vez, os mais de 100 analistas ouvidos semanalmente pelo Banco Central passaram a projetar inflação de dois dígitos para este ano, mais precisamente 10,12% — um dado estarrecedor. Quando a carestia supera a barreira de 10%, recolocá-la novamente nos eixos exige um grande sacrifício para a população. As taxas de juros terão que subir muito além do desejado para conter o ritmo da atividade econômica, levando o país, inclusive, à recessão, com mais desemprego e menor distribuição de renda.
O descontrole de preços ocorre num momento já dramático. Desde o início da pandemia do novo coronavírus, a pobreza retornou com força. O Brasil voltou ao mapa da fome mundial. A taxa de desemprego, embora tenha caído para 13,2% no trimestre encerrado em agosto, é a quarta maior em um ranking de 44 economias elencadas pela agência de classificação de risco Austin Rating. O país só está melhor do que a Costa Rica (15,2%), a Espanha (14,6%) e a Grécia (13,8%). No geral, o desemprego no país é mais do que o dobro da média de 6,5% observada entre as nações avaliadas pela consultoria.
A guerra contra a inflação e o desemprego está longe de ser vencida. O Banco Central, que tem a missão de manter o custo de vida dentro das metas estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) — neste ano, o objetivo é de 3,75% e, em 2022, de 3,5% —, dá sinais de ter perdido o controle das expectativas dos agentes econômicos. Nesse ambiente de desconfiança, as remarcações de preços se multiplicam. Para reviver os tempos sombrios de antes do Plano Real não é preciso muito. Basta que o governo insista na sua política desvairada de destruir o ajuste fiscal com o único objetivo de reeleger o presidente da República.
Todos os alertas sobre os riscos embutidos na postura descompromissada do Palácio do Planalto com o controle das contas públicas foram dados. Bancos e consultorias revisaram as projeções de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) no próximo ano para queda de até 0,5%. As vendas do varejo, o consumo de serviços e a produção industrial vêm operando no vermelho há meses. Nem mesmo a proximidade do fim de ano, quando as fábricas costumam trabalhar a pleno vapor, está sendo suficiente para reverter o pessimismo.
Em vez de agir com rigor para reverter a carestia, o governo prefere de contentar com o discurso de que a inflação está alta em todo o mundo por causa da pandemia. Alega, inclusive, que esse é o preço a ser pago por causa do "fique em casa", quando a ciência recomendou, acertadamente, o isolamento social para conter a disseminação da covid-19. Essa é a administração de Jair Bolsonaro, que, em vez de assumir suas responsabilidades, prefere empurrar o problema para os outros. A inflação realmente subiu no mundo, mas, no Brasil, está muito além do aceitável.
Inflação e desemprego afetam, sobretudo, os mais pobres. Portanto, a sociedade, como um todo, deve cobrar ações enérgicas do governo para que o crescimento econômico equilibrado, com mais produção, volte ao radar. Isso requer políticas consistentes, claras, além de reformas estruturais para melhorar o ambiente de negócios e a competitividade da economia. Não é com uma visão curtoprazista, mirando apenas outubro de 2022, que se conseguirá reverter a alta dos preços e ampliar a oferta de vagas no mercado de trabalho. Governar requer planejamento, equilíbrio e bom senso. Tudo o que está faltando para o principal ocupante do Palácio do Planalto.