Uma das vozes abalizadas que fala em nome da pesquisa científica no país, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) adiantou, em diversas ocasiões, que a ciência do país vive atualmente num ambiente de aridez semelhante ao encontrado no romance Vidas Secas, de Graciliano Ramos, que mostra a dificuldade de sobrevivência em meio ao ambiente hostil e ao descaso do governo com investimentos.
Ao contrário do que pode acreditar o atual governo, é preciso que alguém firme na cabeça do chefe do Executivo a convicção de que sem ciência não há possibilidades de haver desenvolvimento sustentável e contínuo. Sem essas premissas, qualquer governo está fadado ao fracasso.
Ou ele encontra um meio de reconciliação com a ciência e os cientistas, fomentando pesquisas e apoiando o trabalho árduo desses profissionais especializadíssimos, ou o país permanecerá no limbo, exportador de matérias-primas, numa repetição do que foi o seu passado histórico, como colônia, à mercê dos humores das grandes metrópoles, dependente e à margem do mundo desenvolvido.
Alguém dentro do governo precisa convencer o mandatário de que a ciência e a pesquisa representam, hoje, o referencial de riqueza de uma nação. Já foi dito que nenhuma nação moderna logrou experimentar o pleno desenvolvimento abrindo mão da ciência e da pesquisa.
A pecha de que o atual governo se pauta pelo atraso e pelo negacionismo científico precisa ser posta de lado o mais rápido possível. Não em nome de ideais políticos e eleitorais, mas em nome da sociedade a quem todo e qualquer governo deve servir e se submeter. A fonte de recursos, tão necessária para as pesquisas que não podem sofrer interrupções, secou há tempos. Somente no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) teve, recentemente, um bloqueio de R$ 600 milhões.
A falta de verbas para a ciência, em nosso país, de tão grave foi repercutida em várias partes do mundo acadêmico, sendo classificada como um "golpe na ciência". Laboratórios, centros de pesquisa e outros ambientes, nos quais a ciência é buscada incessantemente para a melhoria de vida das pessoas, encontram-se hoje em visível processo de sucateamento, fechados e entregues ao tempo.
Também uma cadeia imensa de profissionais que torna possível o trabalho de cientistas, está sendo prejudicada. Reunir uma equipe de pessoas para fazer funcionar um laboratório de pesquisa, de acordo com as exigências atuais da ciência, não é uma tarefa que se constrói da noite para o dia.
Exige preparo, desde o pessoal que cuida da manutenção desses espaços até das equipes mais especializadas. O mais triste é constatar que, dentro do governo, há, ainda, indivíduos que sabem desses pormenores e estão impedidos de agir por causa de uma ala palaciana que encara a ciência e os cientistas como um mundo averso às ideologias políticas de direita e, portanto, inimigos a serem expelidos do Estado.
Não surpreende que diante de um estado lastimoso que se encontram a pesquisa e aqueles estudiosos ligados à preservação do meio ambiente, a imagem do governo perante o mundo seja a pior possível. O que parece para muitos é que estamos vivenciando um replay dos anos de chumbo, quando o governo passou a enxergar os professores universitários e pesquisadores de ponta como inimigos a serem combatidos e expulsos do país.
A penúria de recursos a que está submetida, hoje, a ciência de ponta, prejudica o país e seu futuro, condenando brasileiros ao subdesenvolvimento eterno. Numa situação dessas em que o governo parece ter declarado guerra à ciência e aos adeptos das pesquisas não surpreendem os protestos, seguidos de declarações públicas desses profissionais contra o descaso do Estado, que se multiplicam a todo momento. Cientes de que o atual governo não cederá espaço às ciências, professores e pesquisadores de todo o país e até do exterior estão numa espécie de mobilização permanente, protestando abertamente contra a atual gestão e a politização, pouco esclarecida, de um governo que tem declarado avesso a esses profissionais.
Em outras partes do mundo, nos países ricos, cientistas e pesquisadores gozam de grande prestígio e, não é por outra razão, são eles que dão os primeiros passos para preparar o futuro material de um país, garantindo instrumentos para os cidadãos enfrentarem os desafios que a todo momento surgem. Um caso exemplar que reforça essa afirmação pode ser conferido na questão do aparecimento, em tempo recorde, da vacina contra a covid-19, desenvolvida por países em que os governos apoiam a ciência.
Obviamente, a culpa desse descaso não cabe somente ao Executivo, mas pode ser compartilhada com o Legislativo, onde uma classe política indiferente não faz esforço algum para apoiar as ciências, preocupada, como está, em garantir vantagens apenas para si e para seus grupos no entorno .
Ao comprometer esse importante setor da vida nacional, o que esse governo faz com aqueles que o apoiam é empurrar no abismo uma parte do potencial humano do país, sufocando parte da nossa história em nome de algum propósito qualquer inominável.