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Goleiro Bruno segue driblando a Justiça

Correio Braziliense
postado em 29/11/2021 06:00

Juliana Brizola - Deputada estadual, líder da bancada do PDT na Assembleia Legislativa do Estado do RS (ALERS), graduada em Direito e Mestra em Ciências Criminais

Tornou-se senso comum escutar que, no Brasil, "a única coisa que dá cadeia é homem que não paga pensão alimentícia". Entretanto, a situação econômica e o status social determinam se o pai que está devendo pensão ao filho/a vai de fato ser preso. Há muitos casos em que os homens recebem salários mínimos, ou estão desempregados, e foram presos por não cumprir o dever de pagar pensão.

No caso do ex-goleiro do Flamengo, Bruno Fernandes de Souza, os fatos causam indignação e uma pergunta sem resposta: por que ele não é punido judicialmente por nunca ter pagado pensão alimentícia ao filho, desde 2012, quando foi publicada a decisão pela justiça? Por que Bruno está solto? Ele afirma que não é o pai do filho de Eliza Samudio, 25, assassinada, em 2010, quando foi cobrar de Bruno o pagamento de pensão alimentícia.

Bruno Souza Samudio foi reconhecido como filho do goleiro em 2012, por paternidade presumida, após Bruno se negar a fazer exame de DNA em 2010. De acordo com a legislação brasileira, essa recusa em fazer o exame tem o mesmo valor que uma confissão de paternidade. A justiça determinou o pagamento de pensão alimentícia, fixando em 17,5% dos seus rendimentos como goleiro. Bruno recorreu, perdeu, e continua sem pagar a dívida de cerca de R$ 3 milhões. Até hoje ele não depositou nem um centavo.

Em 2013, o jogador foi condenado a 22 anos e três meses pelos crimes de homicídio triplamente qualificado, sequestro e ocultação do corpo de Eliza. Em 2019, depois de cumprir 8 anos e 10 meses de prisão, Bruno conseguiu um habeas corpus e está cumprindo pena em regime semiaberto domiciliar. Desde que saiu da prisão, ele retomou sua carreira e já trabalhou em três clubes de futebol. Ele mora em Cabo Frio (RJ), onde vive com a esposa e uma filha.

Além de mãe, o fato de eu ser graduada em Direito e mestra em ciências criminais aumenta minha indignação diante desse caso. Não me conformo em ver que Bruno teve o direito de reconstruir a sua vida, enquanto o filho Bruninho carrega uma história de vida muito pesada. Como é que fica o sofrimento desse menino, um pré-adolescente? A carga psicológica sobre ele é assustadora, pois sente que é culpado pela morte da mãe. A avó, que ficou com a guarda, é que paga a terapia do neto, sendo que o Estado é que deveria pagar. Ela solicitou o auxílio reclusão que os filhos de presos têm direito e também foi negado. Todos os direitos do Bruninho foram violados. Agora, ele manifestou o desejo de mudar seu nome.

É como se os familiares de Eliza fossem punidos por parte do judiciário brasileiro. Não tiveram sequer o direito de velar o corpo de Eliza, que nunca foi encontrado. E ainda têm que lidar com a falta de resposta do judiciário, que liberou o goleiro para voltar a jogar, mesmo não pagando a devida pensão.

A mãe de Eliza vive em Mato Grosso do Sul com grandes dificuldades, e sempre dependeu de doações e "vaquinhas" para manter o neto. Hoje com 11 anos, ele ganhou uma bolsa de estudos porque tem excelentes notas na escola. Já Bruno está solto, cria conta nas redes sociais, onde compartilha sua rotina com muitos seguidores, trabalha como garoto propaganda de canil, publica fotos com pitbull e compra carro de R$ 80 mil.

Como se essa injustiça não bastasse, em Manaus (AM), um funcionário do bar "Porão do Alemão" compartilhou nas redes uma foto de um cliente "fantasiado" com a camisa do Flamengo com o nome "Bruno" e segurando um saco de lixo onde estava escrito "Eliza". A imagem é de uma violência macabra, pois faz referência a uma das versões dadas de que o corpo dela teria sido esquartejado e colocado em um saco de lixo. No Artigo 287 do Código Penal está previsto que "fazer, publicamente, apologia de fato criminoso ou de autor de crime, a pena é de detenção, de três a seis meses, ou multa". A mensagem transmitida é que não basta assassinar e desaparecer com o corpo de uma mulher, tem que depreciar a imagem da vítima, jogá-la na vala comum do deboche.

Esse caso não diz respeito somente às mulheres, mas também aos homens, e ao tipo de sociedade no qual queremos viver. Recompensar Bruno é um tapa na cara de todos os brasileiros. Não conceder nem um direito ao filho é naturalizar o feminicídio. As recompensas concedidas a Bruno demonstram que nem ele, nem a sociedade, refletiram sobre o crime bárbaro cometido.

 

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