Não é raro caber aos nossos irmãos e conterrâneos que moram em outros países, distantes no tempo e espaço, uma visão muito mais acurada sobre o que ocorre dentro do Brasil do que aqueles indivíduos que aqui permanecem por toda a vida. Essa ligação com o país de origem é um fator que, por mais que você viva longe da sua terra, nunca desaparece.
Em alguns casos, esse fenômeno de ligação e de pertencimento até se intensificam com o passar dos anos. Trata-se de um processo natural, intensificado por certa dose de melancolia e saudosismo. É o que os antigos escravos chamavam de banzo.
Essa história de que a pátria está nos sapatos do homem do mundo, pode até fazer sentido para aquele pequeno grupo de indivíduos que adota o planeta como uma casa estendida. De tão raros, esses personagens não pesam na balança que afere os sentimentos de natividade. Estar longe do país de origem faz crescer em muitos um sentimento diferente de nacionalismo, distante do que isso possa significar para oportunistas políticos.
É o nacionalismo da raiz, com tudo o que isso possa representar para o imaginário do indivíduo, incluindo aí sua infância, seus familiares e amigos e todo o ambiente que o cercava no passado. São imagens fixadas na mente e na alma e que nenhuma bonança material presente pode apagar.
Esses eternos estrangeiros, mesmo que possuam um novo documento de cidadania, vivem essa dualidade permanente. Em caso de conflito armado, entre o país que agora residem de forma definitiva e onde muitas vezes constituíram família, uma nova vida e identidade e a antiga terra de origem, de que lado ficarão?
A opção por defender qualquer uma das partes significa, de imediato, uma traição à outra. Mesmo a neutralidade, não optando por nenhuma, pode gerar um sentimento de dupla traição, o que parece ainda pior. Não há escolhas para o estrangeiro de dois países. Assim como não há um apagar das origens. Vive-se numa terra, sempre alheia como alguém do lugar.
O tempo, que a tudo promove o sentimento de pacificação, cuida de ir apagando a língua materna, substituída pelo novo vocábulo local. Palavras e frases inteiras são esquecidas e substituídas por outras do novo idioma. Não é nem uma língua nem outra, é a que basta no momento.
Para aqueles que ainda sonham em um dia retornar, mesmo que saibam no íntimo que nunca mais voltarão, há o refúgio no noticiário. Para isso, leem tudo que encontram sobre seu país de origem. Procuram confirmar suas suspeitas. Muita coisa piorou — e muito. O que apreendem nos jornais que agora acompanham diariamente é que parece não haver saída para o Brasil. Nem hoje, nem amanhã. Se inteiram e ficam em paz, sabendo que o melhor é permanecer onde estão e ir adiando para nunca um possível regresso.
O noticiário diário informa e previne: fique onde está, mesmo sendo um eterno estrangeiro. Por aqui, a situação nacional não possui saída feliz. Até mesmo seus amigos já se dispersaram pelo mundo. Outros morreram. Como morreram também parte de seus familiares, a sua rua e seus amores. Aquela praça e aquele córrego onde costumavam passar horas de sua mocidade já não existem mais. A praça está tomada de mendigos e viciados. O córrego que sobrou virou esgoto à céu aberto.
Os políticos e as elites do Estado, escolhidos pelo voto, que podiam fazer alguma coisa para mudar o rumo da decadência, não apenas não fazem nada, como ainda colaboram para piorar a situação e, assim, permanecerem por cima. Os jornais lá fora informam aos brasileiros de além mar: fiquem onde estão. O Brasil de suas saudades deixou de existir. Retornar por essas bandas é reviver os mesmos pesadelos que fizeram você um dia partir. Fiquem onde estão.
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