Quem chegou a acreditar que os aumentos sucessivos dos combustíveis, ao longo de todo este ano, não teriam peso maior na escalada inflacionária começa a desconfiar que esteve, todo esse tempo, vivendo num mundo de ilusão, onde fenômenos como causa e efeito não possuem relação direta e concreta.
Para tornar essa realidade ainda mais dura, os mecanismos da vida real que poderiam servir de contrapeso para impedir que a inflação nos levasse de volta a um passado que acreditávamos estar definitivamente morto foram, todos eles, torpedeados pelo Congresso e pelo Executivo como parte da caminhada de ambos rumo às próximas eleições de 2022.
Instrumentos como o teto de gastos e a responsabilidade fiscal foram postos de lado, assim como outros inibidores ao desperdício dos recursos públicos por parte de maus gestores, como é o caso aqui da responsabilidade administrativa. Com isso, o país ficou, mais uma vez, exposto a contaminação de sua economia, navegando sem instrumentos em meio à turbulência mundial provocada pela pandemia.
O Legislativo, que poderia nessa travessia pressionar politicamente o governo para conter gastos, faz justamente o contrário, aliando-se ao Executivo. A quebra dessas regras de ouro ameaça-nos a todos e torna o ano de 2022 uma incógnita e um caminho no escuro. O Orçamento do próximo ano, mais do que uma ficção, será uma história da carochinha, ou, como os oposicionistas gostam de denominar, um estelionato eleitoral.
Somados e subtraídos todos esses maus presságios, o xis da questão que, nesse caso, está na política de preços da Petrobras ou na desvalorização do Real frente ao dólar, fica sem resolução, mesmo sabendo que a economia do país viaja na boleia de caminhão.
Mais preocupados com as estratégias que serão armadas nas próximas eleições, o Palácio do Planalto só quer saber de onde encontrar o que restou do dinheiro dos pagadores de impostos para vitaminar seu programa social, o Auxilio Brasil, e assim garantir protagonismo para reeleger-se.
Já se sabe também que, em ano eleitoral, nenhuma reforma que poderia contribuir para a contenção de gastos, no caso a reforma administrativa, tem chance de progredir entre os políticos. Enquanto persiste o aparente embate entre economia e política, os investidores, cientes da perda de credibilidade do governo, saem em debandada, provocando, ainda mais o aumento no dólar e, consequentemente, uma nova onda de subida nos preços dos combustíveis.
O transatlântico Brasil perdeu sua âncora fiscal. Agora, resta encontrar outros meios de mantê-lo em porto seguro, o que também parece nos remeter de volta ao mundo onírico, onde ações e reações não possuem importância para o que se segue.
Ainda em 2014, durante o descerrar das cortinas do doidivana governo da presidenta Dilma, o jornal britânico Financial Times já advertia para a fragilidade que países emergentes como o Brasil, incluído no que chamava de "cinco frágeis", viviam seus dilemas internos, justamente por conta da estreita dependência de suas economias em relação aos preços dos combustíveis.
Já naquela ocasião, o FT falava deste dilema entre manter os preços dos combustíveis com efeitos diretos na inflação, desencorajando o consumo, ou absorvendo esses aumentos por meio de subsídios, forçando o governo a esvaziar os cofres.
De lá para cá, pouco ou nada mudou nesta relação entre os preços praticados pela Petrobras e o aumento da inflação. O que se sabe é que, em qualquer pesquisa histórica que busque encontrar possíveis protagonistas para a escalada da inflação no Brasil, a partir da metade do século passado, a estatal aparecerá em todas elas. Não por culpa de seu desempenho, mas em consequência de gestões políticas erráticas, que sempre prejudicaram tanto a empresa, quanto a economia do país e os brasileiros.
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