OPINIÃO

Como uma nuvem

Correio Braziliense
postado em 08/10/2021 06:00
 (crédito: Gomez)
(crédito: Gomez)

ORLANDO THOMÉ CORDEIRO -Consultor em estratégia

O ex-governador de Minas Gerais Magalhães Pinto cunhou uma frase icônica: “Política é como nuvem. Você olha, ela está de um jeito. Olha de novo, e ela já mudou”. Em diversas ocasiões durante seu mandato, o presidente Bolsonaro fez promessas de moderação que sempre duravam pouquíssimo tempo. Entretanto, o recuo expresso na carta escrita por Michel Temer, as declarações públicas garantindo a realização das eleições e até mesmo os elogios ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tiveram o condão de acalmar o clima no Congresso e no Supremo Tribunal Federal (STF). A consequência imediata foi a redução significativa da chance de abertura do processo de impeachment.

Numa tentativa de reverter o cenário, as oposições apostaram suas fichas na realização de manifestações no sábado passado que, apesar de terem atraído uma presença relevante, ainda ficaram muito distantes de provocar uma nova onda. Está prevista nova rodada para o dia 15 de novembro, mas, ao que tudo indica, o quadro da participação não deverá se alterar significativamente. Portanto, o quadro que se desenha é de um impasse cujo desenlace está marcado para dia 2 de outubro de 2022, com lideranças e partidos políticos ajustando suas velas para as eleições.

Segundo diferentes pesquisas, o retrato de hoje mostra a consolidação do ex-presidente Lula em primeiro lugar e de Bolsonaro em segundo, ambos muito distantes dos demais pré-candidatos. Além de Ciro Gomes, em intensa atividade de pré-campanha, já se lançaram publicamente João Dória, Eduardo Leite, Alessandro Vieira e Mandetta. Também há especulações envolvendo Sérgio Moro, Datena, Luiza Trajano, Rodrigo Pacheco e Simone Tebet. Porém esses nomes que vêm se apresentando como representantes da chamada terceira via ainda não conseguiram demonstrar a tração necessária para impedir a polarização entre os dois líderes.

Também é óbvio que Lula e Bolsonaro não querem mudar esse quadro, pois consideram o outro como seu adversário ideal, apostando em vitória num eventual segundo turno entre eles. Por outro lado, as mesmas pesquisas indicam percentuais que variam entre 25% a 35% de pessoas declarando sua preferência por alguém que surja como uma alternativa. Ou seja, existe um desejo latente que, até o momento, não conseguiu ser apropriado por nenhum dos postulantes. O que pode explicar essa situação?

Em primeiro lugar, é forçoso reconhecer a competência em comunicação que têm o atual e o ex-presidente. Eles usam uma linguagem simples e direta, na qual apontam, segundo seus pontos de vista, os problemas vividos pela população, gerando empatia imediata. Um exemplo é a discussão em torno do desemprego. Ambos atacam o tema, com Lula apontando Bolsonaro como culpado e este último dirigindo suas baterias para quem defendeu o “fique em casa”.

Enquanto isso, a maioria dos demais insiste em focar suas narrativas na desqualificação dos dois, falando exclusivamente para uma pequena parcela de convertidos, sem conseguir empolgar ninguém para além de suas bolhas. Portanto, o desafio posto é encontrar bandeiras e propostas que consigam combinar dois elementos: identificação com parcela expressiva do eleitorado e credibilidade com base na própria biografia. Nesse terreno, alguns surgem com mais chances de acertar a narrativa.

Um deles é Sergio Moro. Ele poderá ocupar um espaço importante caso seja capaz de se apresentar como o candidato que pode enfrentar e derrotar Lula no segundo turno, atraindo para si eleitores de Bolsonaro que se mostram descontentes com sua gestão e abominam a volta do PT ao governo.

Mesmo não se assumindo como candidato, além de um noticiário altamente negativo desde a chamada Vaza Jato e a declaração de sua suspeição pelo STF, vem demonstrando uma resiliência impressionante nas pesquisas, com índices sempre muito próximos dos conquistados por Ciro Gomes. Talvez sejam essas as razões para terem aumentado as especulações nos bastidores de Brasília dando como quase certa sua candidatura.

Outro que tenta ocupar a mesma raia é Alessandro Vieira, cuja visibilidade cresceu de forma vertiginosa devido à atuação na CPI da Covid. Sua narrativa tem sido pautada por procurar capturar o sentimento da luta anticorrupção. Resta saber se terá condições de se manter em evidência após o final dos trabalhos da CPI.

Ao citar os dois nomes acima, não excluo a possibilidade de que entre os demais haja alguém capaz de corrigir suas estratégias e se consolidar como uma candidatura em condições de chegar ao segundo turno contra um dos dois atuais favoritos. Tudo dependerá do comportamento das nuvens políticas.

 

 

 

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