Em 23 de agosto último, o presidente Jair Bolsonaro editou o Decreto nº 10.774, que convoca a 5ª Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial, a ser realizada de 2 a 6 de maio de 2022, em Brasília, sob a coordenação do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, cujo tema será “Enfrentamento ao racismo e às outras formas correlatas de discriminação étnico-raciais e de intolerância religiosa: política de Estado de responsabilidade de todos nós”.
Impossível não supor que se trata de ação eleitoreira, principalmente, devido à leniência do chefe do Executivo ante o discurso violento, racista, com termos de calão, excretados pelo titular da Fundação Palmares contra os negros e todos os movimentos organizados da sociedade civil em defesa dos direitos dos afrodescendentes. “E daí?” Se o presidente não reage, prevalece o velho adágio: “Quem cala, consente”, concorda com todas as ofensas, em franca sintonia com o pensamento e às ações dos supremacistas brancos, que, entre os seus muitos porta-vozes, tem um negro retinto à frente da Palmares.
A tão cobrada igualdade étnico-racial está longe de ser realidade no país. Não se trata de uma percepção exclusiva dos discriminados, tampouco autovitimização ou mi-mi-mi dos não brancos. As expressões de violência não ficam restritas ao discurso ou a tentativas de tolher direitos, em afronta à Constituição, que garante (?) serem todos iguais perante a lei. Elas se manifestam nos campos do trabalho, da educação, da saúde e, mais grotescamente, da segurança pública.
A pandemia do novo coronavírus ressaltou ainda mais as desigualdades. No início da imunização, uma mulher negra foi a primeira a ser vacinada. Uma boa imagem, que conquistou espaço em todas as mídias — e ali ficou. No decorrer do processo, o retrato ficou desbotado. A população não negra recebeu mais do que o dobro de imunizantes do que pretos e pardos. Até dezembro do ano passado, quando o número de óbitos passou de 202,4 mil brasileiros, 74.949 negros haviam perdido a batalha para a covid-19, contra 62.993 brancos, segundo os dados do Boletim Epidemiológico nº 50.
Os desafios à 5º Conferência estão colocados pelos dados oficiais, reveladores do fracasso do poder público e de suas políticas para garantir, minimamente, a vida dos não brancos (parcela majoritária da sociedade) neste país, onde a miscigenação contraria a letal ideologia dos supremacistas.