SACHA CALMON - Advogado
A diplomacia brasileira, até o término do governo Temer, era considerada a melhor das Américas, tradição a remontar os últimos anos do reinado de Pedro II. O ex-presidente Lula se saiu bem na política externa, em que pese a crítica de sua postura em face do regime totalitário de Cuba, mas fossem as contrapartes países capitalistas ou socialistas, os aspectos comerciais e estratégicos nortearam nossos diplomatas seguidamente. Ficou famoso o dito de Barack Obama: “Esse é o cara”.
Com o início do governo de extrema-direita de Jair Bolsonaro, o Brasil perdeu influência. Desde o início, Noruega e Alemanha cortaram as doações em euros para o Fundo Amazônia, ante o descaso do Brasil em relação ao bioma amazônico. A América Latina não vê nosso país com a intimidade de antanho. Nos países socialistas, a postura, é óbvio, ressoa hostilidade nos casos de Cuba e Venezuela. Graves, entretanto, são os laços com Estados Unidos e Europa Ocidental. Bolsonaro teve a indevida postura de apoiar Donald Trump. Mas quem venceu foi Joe Biden, que o olha com desdém. Deu-se ainda à imaturidade de falar da idade da esposa do presidente Emmanuel Macron, da França, uma verdadeira “molecagem” descabida para um chefe de Estado.
Além dessas impropriedades, a todo momento, procurava imitar um dos presidentes mais desprestigiados dos EUA, Trump, tido por “sr. Grosseria”. Dele, imita falar mal da imprensa e falar no “cercadinho” com seus apoiadores fanatizados, tal e qual. Outro dia, encontrou-se com o ultradireitista e isolado presidente da Polônia, Andrzej Duda. Logo o veremos de braço dado com Viktor Orbán, da Hungria, tido como neofascista. Estará formando o trio de extrema-direita hoje existente, contudo, irrelevante e sem nenhuma serventia para a nossa diplomacia política e comercial, muito pelo contrário.
Seus seguidores, sem saber, acertam quando o chamam de mito. Quem já ouviu falar em mitologia grega, tão rica e variada, bem sabe que o mito é o inventado, um não ser, o inexistente, a não ser como narrativa, sendo certo que a expressão está bem plantada no mundo da fantasia. Os idiotizados que chamam o Bozo de mito não sabem que mito é uma expressão derivada da mentira. Por isso, os chamarei doravante de mitômanos, uma palavra que designa de modo elegante as pessoas que acreditam em mitos ou os criam nos seus pensares e dizeres.
Os seguidores de Bolsonaro, hoje reduzidos a 20%, são todos, ou quase todos, da classe média brasileira (está a merecer estudos sobre o seu modo de ver o mundo). Essa gente viu na assembleia da Organização das Nações Unidas (ONU) um mitômano de marca maior. Disse tudo que ele não é, embora, a certa altura, tenha recitado o slogan do bispo D. Sigaud: “Deus, pátria e família”. Na assembleia da ONU, causou um certo espanto essa cafonice. Não era ali o lugar apropriado para declarações desse jaez.
No mais, o presidente Jair Bolsonaro abriu a 76ª Sessão da Assembleia-Geral da ONU com um discurso caro a seus apoiadores. Durante 12 minutos, a representantes de 193 países, defendeu um tratamento ineficaz contra a covid-19, apresentou dados distorcidos sobre o desmatamento na Amazônia, falou sobre um suposto fim da corrupção como um avanço de seu governo.
Bolsonaro apresentou o país como um destino seguro para investimentos. “Temos o que o investidor procura: mercado consumidor, respeito a contratos e confiança no governo.” Disse que a estimativa de crescimento do país neste ano é de 5%, mas não citou que as previsões para 2022 estão abaixo de 2%.
Como sempre, conversa fiada e ocultação de dados. Os principais jornais do mundo, com correspondentes aqui, o contestaram: El País, Le Monde, NY Times, The Guardian, Washington Post e outros. O que se dá é termos um país seriamente dividido. E, pela primeira vez, o ódio embala o nosso conviver político. Mas temos que aguentar e esperar um governo que se volte para obras e investimentos públicos, além de estimular e atrair investidores daqui e de fora. Este governo não fez nada na infraestrutura do país. E ainda ameaça à democracia.