OPINIÃO

Visto, lido e ouvido — O kintsugi e o vaso das leis

Entre nós, só existe uma entidade realmente capaz de fazer cessarem as críticas contra o Judiciário e reverter o descrédito, se isso é possível, que a grande maioria da população nutre em relação ao nosso modelo de justiça. Enganam-se aqueles que pensam que a imprensa tem esse poder, ou que os políticos poderiam ajudar a melhorar a imagem do Judiciário, desgastado, praticamente desde que, por aqui, Cabral aportou.

O ranço elitista pespegado à nossa Justiça vem de longe e parece aumentar com o passar dos anos. Por mais que alguns abnegados magistrados, espalhados por esse imenso Brasil, se esforcem para fazer com que a justiça tenha o lugar que merece como árbitro a equilibrar os valores da civilidade e da cidadania, as altas cortes, ilhadas em capitais, como Brasília, sempre encontram um meio de fazer pender a balança dos vereditos em benefício dos mais favorecidos.

Na verdade, somente o Judiciário e seus operadores seriam capazes de recompor os milhares de cacos em que o cristal de alabastro das leis vem se espatifando. Talvez essa missão possa caber às faculdades de ensino do direito, indo em busca das origens para observar em que ponto essa ciência humana começou a desandar. Talvez, introduzindo nas grades curriculares desse curso disciplinas que aliassem à didática jurídica, ensinamentos voltados às práticas da ética e das artes, como meio de fazer ver, aos novos alunos, que existe vida e espírito além das letras mortas da lei.

Nesse sentido, ética e estética poderiam se fundir, num exercício de refinamento dos espíritos e das mentes. Não há beleza onde a ética esteja ausente. Esse é pelo menos o que ensinavam os antigos gregos do período clássico, num detalhe, talvez esquecido, na formulação desses novos cursos de direito. Muito adiantaria, à tão grande variedade de escolas de direito, que brotaram por toda a parte, despertar, tanto em seu corpo docente quanto discente, os valores frágeis e etéreos que unem beleza e verdade, e que somente a arte parece apontar como fato relevante.

Existe uma antiga técnica japonesa chamada kintsugi, surgida ainda quando o Brasil era uma colônia de Portugal, que exercita a recomposição e a restauração de cerâmicas e porcelanas que quebraram, por meio da utilização de uma espécie de cola ou verniz, misturada a pó de ouro, para que as fissuras se destaquem entre os remendos, apresentando em destaque a beleza das cicatrizes da vida, mostrando que é sempre possível refazer do erros e adversidades.

Essa que parece, à primeira vista, ser uma solução singela e até frugal é tudo o que a nossa Justiça necessita, nesse primeiro momento, para começar a remendar os muitos cacos em que parte da elite do Poder Judiciário vem fazendo com as nossas leis. O que o Supremo tem feito, ao desmanchar com os pés o imenso trabalho que a força tarefa da Lava-Jato fez, anos a fio, com as mãos e a mente, estilhaçando, um a um, todos os processos referentes ao maior caso de corrupção que esse país experimentou, apenas para livrar seu maior protagonista, é um desses exercícios que mostra bem ao alunado de direito a dificuldade que as novas gerações de doutores terão pela frente, para reunir novamente o fino vaso das leis, pulverizado por gananciosos e suas chicanas ilusionistas.


A frase que foi pronunciada

“Deus, espero que o senhor possa ajudar a melhorar o estado da situação… Ou será que é a situação do Estado?”
Mafalda


Regata
No dia 18, está agendada a 2ª Regata Ecológica alusiva ao Dia Mundial da Limpeza e o Esforço da Consciência Ambiental. A iniciativa é da Marinha do Brasil. Uma gincana será a força motriz para deixar o lago Paranoá limpo.


Novidade
Por falar em ecologia vale o registro do aplicativo desenvolvido pela UnB com o patrocínio da Aufinate. O monitoramento das áreas do cerrado desmatadas pode ser encontrado no Radis, disponível gratuitamente. Mário Ávila, do projeto Restaura Cerrado, acredita que essa é uma forma descomplicada de cumprir a regularização ambiental do cerrado.


História de Brasília

Já começaram a desmanchar o canteiro de obras do prédio da Central de Telex, que o dr. Jânio queria construir na superquadra 208, em frente ao bloco onze.
(Publicada em 8/2/1962).