OPINIÃO

É hora de dar um basta!

» ORLANDO THOMÉ CORDEIRO - Consultor em estratégia

Nos últimos dois meses, Bolsonaro e apoiadores dedicaram seu tempo e energia para convocar para dia 7 de setembro o que seriam as maiores manifestações populares já vistas. Não pouparam esforços, promovendo ações de mobilização, usando sistematicamente as redes sociais, concedendo entrevistas diárias a rádios e fazendo discursos em solenidades oficiais.

A pauta foi se adequando a cada momento político. Primeiramente, adotaram a bandeira do voto impresso, um claro retrocesso em nosso sistema comprovadamente confiável. Com a derrota dessa proposta na Câmara, retiraram da gaveta uma antiga bandeira, que têm sempre à mão: os ataques frontais ao Supremo Tribunal Federal (STF), na figura do ministro Alexandre de Moraes, principalmente após as justas e corretas prisões decretadas por ele a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR).

Na última semana, alinharam a narrativa em torno da ideia de que as manifestações teriam como grande e nobre objetivo a defesa da liberdade. Nesse conceito, para eles, pode-se tudo. Desde ameaças públicas de morte a ministros e a adversários políticos, passando pelo pedido de fechamento do STF e chegando à intervenção militar. Finalmente, chegou para eles o tão esperado dia. Foram manifestações que levaram às ruas centenas de milhares de pessoas representantes da parcela da população que apoia o presidente, algo na faixa de 25%.

Brasília e São Paulo foram os locais escolhidos como palco para o show presidencial. Os chamados bombeiros do governo tinham a esperança de que não houvesse excessos em seus discursos. Doce ilusão! Isolado politicamente e acuado pelo crescente aumento de rejeição a seu governo, como demonstrado nas pesquisas, resolveu radicalizar, proferindo as seguintes declarações: “Qualquer decisão do senhor Alexandre de Moraes, esse presidente não mais cumprirá”; “Não podemos admitir um sistema eleitoral que não oferece qualquer segurança”; “E dizer aqueles que querem me tornar inelegível em Brasília: só Deus me tira de lá”.

Ora, nada diferente a esperar de um presidente que adota um comportamento de influenciador digital. Afinal, desde que, formalmente, tomou posse, há 32 meses e 10 dias, nunca desceu do palanque de campanha, deixando de lado a intransferível responsabilidade com a governança do país, função para a qual foi eleito com quase 58 milhões de votos.

Não seria agora que falaria sobre os principais dramas vividos pela população: aumento do custo de vida, crise hídrica, inflação fora de controle, desemprego, gasolina a R$ 7 e botijão de gás a R$ 120, problemas cuja origem é um executivo absolutamente incompetente! Como ele jamais vai reconhecer, a saída é desviar a atenção, apontando culpados com o argumento de que não o deixam governar.

Porém, sua estratégia é muito mais danosa para a democracia. Trata-se de criar confronto e estimular a desobediência civil. Sua radicalização parte da premissa que a Câmara dos Deputados, dominada pelo Centrão, não autorizará o impeachment, permitindo a ele continuar tensionando o país e acenando aos apoiadores com a possibilidade de não aceitar a cada vez mais provável derrota nas eleições de 2022.

Em resposta às declarações presidenciais, no dia 8, tivemos os pronunciamentos dos presidentes da Câmara e do STF. O primeiro, a maior liderança do Centrão, com um semblante visivelmente tenso, fez novo apelo ao entendimento, apenas pontuando seu descontentamento com a insistência no voto impresso. Na essência, “passou pano” mais uma vez.

O ministro Fux foi absolutamente contundente, apontando o dedo para o crime de responsabilidade cometido pelo presidente ao afirmar que não cumprirá decisões da Justiça e chamando às falas os representantes do poder legislativo para que cumpram seu papel constitucional. A consequência imediata é que a negociação em torno dos R$ 89 bilhões de precatórios e a indicação de André Mendonça para o STF subiram no telhado.

E, no próximo domingo (12/9), as manifestações convocadas por MBL e Vem Pra Rua ganharam a adesão de partidos de esquerda e de centrais sindicais. Tudo indica que serão bem grandes, aumentando a pressão sobre Bolsonaro e Arthur Lira.

Se hoje há dificuldade política para a abertura do processo de impeachment, todo mundo sabe que o Centrão “até vai ao enterro, chora, mas não entra junto na cova”. Faltam quase 13 meses para as eleições e, a cada dia, fica evidente para mais lideranças de diversos partidos que o país não pode continuar entregue por tanto tempo às irresponsabilidades de um mandatário que só pensa em ser um ditador ao estilo Erdogan, Orban, Maduro ou Putin. É hora de dar um basta!