A luta, que é dança, que é grito, que é pintura. A luta, que tem sido tantas vezes inglória, negligenciada, silenciada. A mais linda e legítima ocupação que a Esplanada dos Ministérios já viu. A peregrinação de 6 mil índios de 137 etnias que saíram de suas terras para protestar na capital do poder e pedir pela não validação do Marco Temporal pelo Supremo Tribunal Federal (STF) abre os olhos e joga luz sobre a nossa mediocridade.
O brasileiro não se cansa de invisibilizar a luta dos povos indígenas pelo direito de existir e de ocupar legitimamente uma terra que sempre foi deles. Somos nada mais que larápios desde sempre e ainda destruidores das nossas florestas. E ainda posamos de civilizados. Por sorte, ainda há um tanto de gente que apoia, entende, defende e segura na mão dos índios. Espero que a Justiça faça o mesmo e não corrobore com o eterno vilipêndio.
Lendo as crônicas de Severino Francisco no Correio sobre as manifestações indígenas na Esplanada, chamando a atenção para o claro direito dos índios sobre esta trapaça jurídica intitulada Marco Temporal, eu me lembrei que de quem sempre foi voz em defesa deles.
Entre todas as instituições, ONGs e jornalistas sérios que levantam a bandeira da causa indígena, eu me recordei dos meus primórdios em Brasília e das rodas de conversa nas quais entrava de penetra. Ouvia e aprendia sobre os índios com três jornalistas brilhantes, Valéria Velasco, Memélia Moreira e Eliana Lucena, além de Severino Francisco, com quem tenho a honra de ainda trabalhar.
Valéria editava a revista do Ministério do Interior, para a qual outros colegas também escreviam, registrando lindamente a luta indígena. E eu lia sobre os bastidores das visitas às terras indígenas, entre outras matérias. Quantas vezes ouvia esses colegas incríveis, nos últimos anos da década de 1980 e início dos anos 1990, alertar contra os sucessivos erros dos governos em relação aos povos indígenas?
Tenho consciência de que as vozes eram e são muito poucas ainda na imprensa brasileira. Aqui, um mea culpa também, porque não transforma a realidade, nem me redime, mas me dá a permissão para olhar com mais atenção e cuidado para a causa indígena. Não há avanço sem reconhecimento e sem verdade.
Não tenho dúvida de que o preço que pagamos hoje com as mudanças climáticas e com o desmatamento é a pena pelo saque eterno ao direito dos povos originários da floresta. Os índios vivem um momento dramático e nós ainda temos de aprender muito com eles, mesmo que eles não tenham a obrigação de nos ensinar sempre as mesmas coisas.
Só a existência deles em suas terras já garante a proteção das florestas e a perpetuação de uma sabedoria milenar, que o nosso parco conhecimento, pouco apreço pela história e eterno preconceito não nos permitem sequer chegar perto.