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Visão do Correio: Energia é vital para o país

A decisão do governo de permitir que grandes consumidores de energia elétrica possam reduzir seu consumo e, assim, liberar carga para o sistema elétrico nacional, com recebimento de um pagamento, chega em boa hora, mas já poderia ter sido implementada diante da gravidade do quadro hídrico do país. A falta de chuvas e o baixo nível dos reservatórios das usinas hidrelétricas ameaçam a economia brasileira, seja porque elevam o preço da eletricidade, dando um choque na inflação, seja porque a carência dela pode ser desastrosa para a geração de riquezas. Não há crescimento econômico sem energia.

Com a seca histórica, os reservatórios das hidrelétricas do Sudeste/Centro-Oeste, que respondem por cerca de 70% da capacidade de geração hídrica do país, que, por sua vez, equivale a mais de 60% de toda a energia gerada no território brasileiro, estão em níveis críticos. Dados do Operador Nacional do Sistema (ONS) mostram que, na semana passada, esses reservatórios estavam com 23% da capacidade, podendo fechar o mês em 21%. Em agosto do ano passado, essas mesmas usinas operavam com 42,3% e, em 2001, ano do racionamento, o nível era de 26,85%.

Apesar dos níveis piores dos reservatórios, o Brasil não enfrenta racionamento porque, em 20 anos, usinas térmicas foram construídas, assim como linhas de transmissão interligando as regiões do Brasil, que, por ser continental, tem diferentes regimes de chuvas. Esses investimentos, no entanto, não foram suficientes para afastar o risco de desabastecimento energético. A persistência da seca pode levar esses reservatórios do Sudeste/Centro-Oeste a inimagináveis 10% de armazenamento em novembro, início efetivo do período chuvoso nessas regiões.

Isso significa que um regime de chuvas abaixo das médias históricas deixa o país extremamente vulnerável à necessidade de um racionamento. Sem energia, a atividade econômica deixa de crescer, e o preço da conta de luz dispara, punindo todos os consumidores. Apenas este ano, com a necessidade de se acionar todas as usinas térmicas, o preço da energia subiu 7%. E deve subir mais 16% no ano que vem, para cobrir os custos dessa geração mais cara das termelétricas. Sem contar o impacto das bandeiras tarifárias, que devem vigorar mesmo nos meses do período chuvoso. Com isso, a inflação oficial passa, e muito, do teto da meta fixada para este ano.

A entrada em vigor do Programa de Redução Voluntária de Demanda de Energia Elétrica deve liberar entre 20 e 35 megawatts (MW) por dia de energia para o sistema nacional. Diante do aumento do consumo com a liberação das atividades econômicas — só no primeiro semestre, a demanda cresceu 7,7% —, a redução da demanda é a única alternativa (além da importação) para se garantir a oferta de energia. Dessa forma, o governo deveria ampliar os benefícios e a divulgação da tarifa branca, que permite, aos consumidores residenciais, reduzir a conta de luz com o uso em horários que não pressionam o sistema.

Todo esforço é válido para se evitar o contingenciamento compulsório do consumo de energia elétrica. Em 2001, isso custou ao país três pontos percentuais a menos no crescimento econômico e uma inflação de 7,67% no ano e de 12,53% no seguinte. Passaram-se duas décadas, e o país está novamente diante da possibilidade de restrição no abastecimento energético. É certo que hoje o Brasil é menos dependente da energia hídrica, mas ainda o é.

Exige-se, então, incentivos fortes e firmes a novas formas de geração e ao uso racional da energia, para que, no futuro próximo, o país não venha novamente enfrentar riscos de racionamento ou o próprio contingenciamento. Basta dizer que, sem chuvas abundantes, teremos problemas já no início de 2022.