Irineu Evangelista de Souza, homem elegante, refinado e assertivo sem ser grosseiro, que passou à história como o barão de Mauá, inaugurou a Revolução Industrial no Brasil. No impulso que deu à economia, produziu a criação de estaleiros e fundições, companhias de linhas telegráficas, ferrovias, iluminação a gás e transporte urbano. Para coroar, fundou um banco, o Banco do Brasil. Poderosa casa bancária que socorreu a falida elite rural escravocrata, como também financiou a Guerra do Paraguai e acudiu com trocados a gastança do Império do Brasil.
A lenda urbana ensina que o verdadeiro sonho só acontece na vigília, quando ainda é possível mudar a realidade. Não foram parafusos, chapas de aço, navios ou ferrovias que levaram Mauá a plantar sementes do capitalismo moderno. Uma frase resume essa saga: “O melhor programa econômico de governo é não atrapalhar aqueles que produzem, investem, poupam, empregam, trabalham e consomem”.
Estava descoberta a grande mágica do delicado equilíbrio entre humanidade, capital e trabalho. A consequência direta de quem produz, investe, poupa, emprega e trabalha é a capacidade de gerar consumo. Uma atividade que realimenta o sistema com novos capitais, empregos e circulação financeira. Assim, é a prova dos nove do desenvolvimento. Acontece que uma pequena partícula adversativa complica a sentença, justamente o “se”. Mas tudo isso só é possível se houver um sistema em que os trabalhadores sejam bem pagos para produzir em paz. Felizes, saudáveis, educados e bem formados para saberem consumir.
Toda instituição traz em si o germe de sua sobrevivência e o capital carrega consigo o sistema social para seu sucesso. Este é o axioma que inspirou Getúlio Vargas, na década de 40; iniciar uma ponte entre empregadores e empregados, empreendedores e mão de obra qualificada. Criou um Sistema Social com as primeiras legislações trabalhistas. Esse serviço, diretamente ligado às corporações produtivas, viria englobar no correr do tempo as áreas empresariais da indústria, comércio, serviços, agricultura e transportes. Em todas, a fórmula era a mesma; a união de lazer, esportes, educação e formação profissional para os trabalhadores de cada uma dessas categorias.
A iniciativa privada, protagonista desse processo, precisa gerar seus recursos na intimidade do circuito capital-trabalho. Para isso, um percentual da folha de pagamento dos trabalhadores deve financiar a qualidade de vida pessoal e profissional do próprio trabalhador que, preparado e feliz, produzirá melhor para gerar consumo e empregos. Parece uma alegre brincadeira de roda, mas, para não ficar na berlinda, deve haver a garantia de que o financiamento do sistema, nunca será pago pelo empregado.
Bem azeitado e competente, assim funciona nosso sistema social, que, comendo letras e formando sigla, é o que chamamos de Sistema S: pedra inaugural da grande transformação das relações de trabalho com olhar preferencial ao trabalhador.
Desde que me entendo na vida, o trabalho associativo sindical sempre me fascinou. O ingrediente de humanidade que se imprime ao trabalho, produz conforto e equilíbrio. Ainda jovem, quando a curiosidade e o prazer da leitura me apresentaram a Gilberto Freire, conheci um pequeno texto que deu sentido ao encantamento que a novidade dos saberes me provoca. “Sem o fim social, o saber será a maior das futilidades”, ensinou o Mestre de Apipucos. Ganhei meu Norte para o futuro e, assim, todo o magnetismo pelas novidades do mundo tiveram seu propósito.
Guiado por esse sentimento de compromisso social como orientação, me iniciei no associativismo sindical. Cedo aprendi que não há compromisso social que prospere sem sólidas raízes na educação. Educação para vida, para a descoberta, para a liberdade. “A mente que se abre a uma nova ideia jamais voltará ao seu tamanho original”, sentenciou Einstein.
Educação não é apenas competição ou busca de um lugar no mercado de trabalho; educação é formação de caráter. Mas, cuidado, ensinai, mas vigiai: às vezes, a evangelização do saber pode disfarçar o braço ideológico marxista que Gramsci perigosamente soube propor para contaminar a juventude. Por isso, publico o livro Sistema S: breve relato sobre sua história e importância. Será a homenagem maior que faço à boa educação profissional, ao prazer no trabalho, à saúde de quem trabalha e a todas aquelas finas virtudes que nos permitem reconhecer que a vida é bela: vale muito a pena, e é a única herança para melhorar a espécie humana.
*Francisco Valdeci de Sousa Cavalcante é primeiro vice-presidente da Confederação Nacional do Comércio (CNC ) e presidente do Conselho Regional do Sesc e Senac no DF