Em 2017, em um painel intitulado A ética como valor essencial, com a participação de dois ex-reitores da Universidade de Brasília, professores Cristovam Buarque e José Geraldo de Souza Junior, o ex-ministro e ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Carlos Ayres Britto enfatizou que a prioridade das prioridades no Brasil é um encurtamento da distância social. A injustiça social no Brasil abrange várias dimensões.
Aceitamos por séculos conviver, com certa naturalidade, com a escravidão e com uma estrutura social que privilegia poucos coexistindo com a supressão dos benefícios e direitos de outros. As pesquisas sociais apontam que as injustiças sociais são mais frequentes em certos grupos sociais, como, por exemplo, as mulheres, que recebem salários menores que os homens, ocorrendo também com os negros. O rendimento domiciliar per capita médio de negros ou pardos é a metade do recebido pelos brancos. Outro exemplo é que a violência afeta muito mais os jovens que possuem baixa escolaridade e que estão desempregados.
Lamentavelmente, a pobreza e a extrema pobreza continuam a ser vergonhosas na sociedade brasileira. Segundo os dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o país tinha 13,5 milhões de pessoas em situação de extrema pobreza. Somadas aos que estão na linha de pobreza, chegam a 25% da população do país. Esses números são inaceitáveis configurando uma tragédia nacional. Esse cenário tem efeitos devastadores para a dignidade das pessoas. Para as crianças e adolescentes, trazem consequências drásticas, comprometendo o seu desenvolvimento, condenando-os ao estado permanente de vulnerabilidade, perpetuando o ciclo da pobreza.
Os dados da disparidade são alarmantes em todo o planeta. Segundo a Oxfam, organização de combate à pobreza e à injustiça social, em 2020, quase a metade das pessoas no planeta sobrevive com menos de US$ 5,50 por dia. Na pandemia da covid-19, o quadro social planetário foi severamente impactado. No Brasil, uma pesquisa realizada pela Escola Nacional de Administração Pública (Enap) mostrou que os municípios brasileiros mais vulneráveis à doença também são aqueles cuja população apresenta maiores diferenças socioeconômicas.
Combater a extrema desigualdade no mundo é medida necessária e cada vez mais defendida por economistas e especialistas de diferentes perspectivas ideológicas. Em países desenvolvidos, a principal estratégia adotada com sucesso é a efetivação de um sistema tributário progressivo, taxando mais os contribuintes com maior renda e patrimônio. Esse sistema permite dinamizar os recursos concentrados no topo da pirâmide econômica, aumentando consumo, emprego e renda nas demais camadas sociais.
O ex-senador Eduardo Suplicy, há muito tempo, tem pregado que medidas de combate à desigualdade devem estar no centro do debate e das prioridades. Ele é o autor da Renda Básica de Cidadania, lei sancionada em 2004 que prevê o direito de todos os brasileiros, independentemente da condição econômica, receberem um auxílio financeiro que resguarde as necessidades vitais de todas as pessoas.
A lei nunca saiu do papel por falta de norma que regulamente sua implementação. O Supremo Tribunal Federal, atendendo a ação da Defensoria Pública da União, determinou que o governo tem até 2022 para implementar um programa nacional de renda básica, com um valor a ser definido e pago mensalmente para os brasileiros em situação de extrema pobreza. Esse seria um primeiro passo importante para que as populações mais vulneráveis possam ter uma vida mais digna.
Mitigar e extinguir a fome e a pobreza são a prioridade das prioridades. Vamos adotar as metas do Papa Francisco: terra, teto e trabalho para todos e todas. Vamos usar como bússola, para termos uma verdadeira justiça social, os três aforismos: 1. “Os sete pecados capitais responsáveis pelas injustiças sociais são: riqueza sem trabalho; prazeres sem escrúpulos; conhecimento sem sabedoria; comércio sem moral; política sem idealismo; religião sem sacrifício; e ciência sem humanismo” (Mahatma Gandhi); 2. “Quando a educação não é libertadora, o sonho do oprimido é ser opressor” (Paulo Freire); 3. “Entre todas as injustiças, nenhuma clamam tanto ao céu como as que tiram a liberdade aos que nasceram livres e as que não pagam o suor aos que trabalham” (Padre Antônio Vieira).