O ministro da Economia, Paulo Guedes, presta um desfavor ao país ao atacar o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), responsável por alguns dos mais importantes levantamentos sobre a realidade brasileira. Por discordar dos resultados da pesquisa sobre desemprego, que mostra 14,8 milhões de pessoas fora do mercado de trabalho, ele disse que o instituto ainda “está nos tempos da pedra lascada”. Guedes, como é característica entre integrantes do atual governo, prefere desqualificar o que o contraria em vez de apresentar propostas para melhorar o que é possível. Puro negacionismo.
O IBGE é uma das mais respeitadas instituições do país, tanto internamente quanto no exterior. Ao longo de sua existência, tem dado contribuições fundamentais para a execução de políticas públicas. Isso não quer dizer, porém, que seu trabalho não possa ser aprimorado. Sempre pode. O problema é que não há vontade por parte do governo de investir no instituto. Muito pelo contrário, o IBGE tem sido esvaziado nos últimos anos, com seu orçamento cortado, a ponto de ainda não ter realizado o censo demográfico previsto para 2020.
Funcionários do IBGE dizem que têm pedido, reiteradamente, ao Ministério da Economia mais verbas para reforçar as pesquisas. Mas só ouvem “não”. Afirmam, ainda, que não há como o ministro querer comparar os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) com os da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, devido às diferenças de suas metodologias.
O Caged pega apenas registros de empregos com carteira assinada. A Pnad inclui o mercado informal, no qual está boa parte da população economicamente ativa. Guedes não se conforma com a taxa de desemprego estar em 14,6%, quando o país criou mais de 1,5 milhão de postos formais nos primeiros seis meses do ano.
Em vez de atacar o IBGE, o ministro deveria fazer o que lhe cabe, pois o IBGE está sob sua alçada: dar instrumentos para que todos os aprimoramentos necessários sejam feitos. Esse é o caminho correto, não o descrédito e o descaso, que têm sido a marca de Guedes quando o assunto é o instituto. Também seria de bom tom que o chefe da equipe econômica usasse boa parte de seu tempo para formular políticas de combate ao desemprego. Não é por meio da retórica belicista que ele conseguirá maquiar os dados do mercado de trabalho, que são assustadores, ressalte-se.
O descaso do governo e os ataques a quem não compartilha de suas visões não se restringem ao IBGE. Foi esse mesmo comportamento que levou ao terrível incêndio que devastou grande parte do acervo da Cinemateca Brasileira, que abriga a história do cinema e da televisão no país. Desde que o presidente Jair Bolsonaro tomou posse, a cultura, vista como inimiga, foi relegada ao esquecimento. Instalou-se, nesse setor, uma guerra ideológica em que tudo o que vai contra o pensamento retrógrado vigente no Palácio do Planalto deve ser atacado e apagado.
Está claro que o incêndio no galpão da Cinemateca, em São Paulo, não foi um acidente. É resultado da tragédia em que se transformou a política cultural do país. Como pode uma preciosidade como o arquivo da Cinemateca ter ficado tanto tempo sem cuidado? Isso só é explicado pelo fanatismo e a ignorância que predominam no governo. Uma cultura diversa é fundamental para a sociedade. Tentar apagar o que se construiu até agora é criminoso. É preciso uma reação forte daqueles que sabem da importância de se preservar a história do Brasil.
Infelizmente, há uma passividade da população ante o ataque às instituições. Agora, Guedes mina a credibilidade do IBGE. A Cinemateca está restrita a cinzas. O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) sofreu um apagão sem precedentes. O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), com toda sua expertise, foi censurado por mostrar a trágica realidade das queimadas que destroem a Amazônia e o Pantanal. Sem uma reação efetiva da sociedade contra esses movimentos, o atraso vai imperar. E a fatura a ser paga será pesadíssima.