LUIZ VIANA QUEIROZ
Milito na advocacia eleitoral há mais de 30 anos, dos quais nos últimos vinte e cinco convivendo com a urna eletrônica que afere a vontade do povo brasileiro. É inquestionável o avanço que ela representou e as vantagens que o sistema trouxe para o processo eleitoral brasileiro, desde sua implantação. Trouxe segurança, transparência e respeito à vontade popular. Neste período, na labuta dos pleitos municipais, estaduais e federal, testemunhei como a urna eletrônica praticamente eliminou o manuseio criminoso dos votos, especialmente na sua totalização. Na Bahia, acompanhei os dois últimos casos de recontagem no estado ainda na década de 90 e constatei isso.
Só quem não conhece a história das eleições no Brasil desconhece a importância das urnas que erradicaram a fraude nos mapas de totalização. Estranho, portanto, que, nos dias de hoje, questiona-se de maneira tão incisiva e irracional uma das maiores conquistas eleitorais da sociedade brasileira. É claro que as urnas podem e devem ser aprimoradas, mas, entre elas, não está, nos dias de hoje, a necessidade de se adotar o voto impresso, que apenas ampliaria o risco de retorno às fraudes na totalização, como ocorria no passado.
Como representante do Conselho Federal da OAB no Tribunal Superior Eleitoral, nas últimas eleições, apus minha assinatura na certificação da lisura dos sistemas usados nas urnas e em todo processo eleitoral, devidamente auditados. Não houve qualquer impugnação séria sobre o funcionamento dos diversos sistemas, facilmente auditáveis. Não há, a meu juízo, consistência jurídica para que as urnas eletrônicas sejam atacadas pois elas são confiáveis.
Assim, é incompreensível e inaceitável a forma da pressão política que se vem fazendo, tanto em relação ao Congresso Nacional quanto aos tribunais superiores, e que não encontra guarida na realidade eleitoral brasileira. Jamais uma denúncia de fraude prosperou em todo o território nacional em 13 eleições realizadas desde 1996, com o uso de centenas de milhares de urnas eletrônicas. Registre-se que aqueles equipamentos que apresentaram problemas técnicos foram imediatamente substituídos e representaram, em média, cerca de 1% da totalidade.
O manifesto dos 18 presidentes e ex-presidentes do Tribunal Superior Eleitoral e o discurso irretocável do ministro Luís Barroso na reabertura dos trabalhos neste semestre sintetizam o valor histórico das urnas eletrônicas na vida político-eleitoral do país. Não há o que acrescentar.
A constante e insidiosa campanha que se faz para desqualificar o processo eleitoral brasileiro não contribui para nossa democracia republicana estruturada na Constituição de 1988, que possui como cláusula pétrea o voto direto, secreto e universal como instrumento de manifestação da vontade livre e soberana do povo.
A convivência independente e harmoniosa entres os Poderes da República exige respeito, seriedade e rigoroso zelo às “quatro linhas da Constituição”. Numa República democrática deve imperar a separação de poderes, sempre com respeito mútuo. As regras democráticas são claras e impõem-se a todos, especialmente, aos que ocupam os mais elevados cargos da Nação, seja no Executivo ou no Legislativo, cuja titularidade decorre exatamente de eleições limpas com as urnas eletrônicas. Deles deveria partir o maior exemplo para todos os cidadãos.
Há de se condenar a insidiosa prática política, que é reproduzida em redes sociais como fake news que, infelizmente, ganham vida e que tentam tornar verdadeiro o que é mentira. Como bem ensinou o TSE num vídeo, a repetição de uma mentira não a torna verdade. O esclarecimento é a luz que repõe a verdade.Não há por que mudar e nem o que mudar no uso das urnas eletrônicas e voltarmos para o passado do voto impresso. Retornar ao voto impresso é retroceder no tempo. É trazer as mazelas eleitorais do Império e da Velha República aos dias de hoje com risco de retorno das fraudes na totalização dos votos.
O atual modelo é o garantidor da vontade popular. E, por mais que se tente desmoralizá-lo, não se logrará sucesso. Não existem provas de fraudes e por uma razão bem simples: elas não ocorreram. Sem prova, não há crime.
Pena que o Congresso Nacional discuta uma reforma eleitoral num clima tão carregado de emoções e versões fantasiosas. Aprimoramentos são necessários e poderiam ser realizados, mas a discussão está contaminada por uma polarização inconsequente de bolhas que apenas se dedicam a odiar-se mutuamente. Por fim, reproduzo o que disse Yuval Harari, recentemente: “O grande risco, hoje, não é o vírus, mas os demônios internos da alma humana – ódio, ganância e ignorância. Contra eles é preciso incentivar a cultura da compaixão, da solidariedade e da sabedoria”. É isso que o Brasil precisa.
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