Artigo

Redemocratização no país da Foca Autoritária

A conquista da redemocratização sem passar por uma dolorosa ruptura foi o resultado milagroso dos esforços de um povo ordeiro

Mesmo soterrados debaixo de narrativas psicopolíticas, os fatos não deixam mentir: vivemos na era mais democrática do Brasil desde o Império. O antigo “sistema democrático” de um polo (cujas divergências entre esquerdistas não passavam de nuances) ficou para trás em 2018, depois de um período de mudanças que teve como símbolo máximo a eleição de um líder de direita. Jair Messias Bolsonaro captou das camadas silenciosas da sociedade a vontade de ver seu país carregado pela mão no caminho de volta à barulhenta democracia brasileira. A conquista da redemocratização sem passar por uma dolorosa ruptura foi o resultado milagroso dos esforços de um povo ordeiro.

Apesar desse primeiro passo, muito ainda precisa ser feito para que a redemocratização se efetive por mais tempo, e para isso devemos manter a vigilância. É público e notório que esse novo grupo político conservador — proibido de existir até pouco tempo — é alvo de toda a sorte de ataques, tanto por meios verbais quanto por ações políticas via repressão estatal. Assistimos diariamente à antiga “democracia de um polo” tentando voltar através da supressão de vozes, da destruição de reputações e, quando possível, do enclausuramento físico e mental de seus adversários.

Esse tipo de estratégia, que se utiliza de narrativas para prender psicologicamente os pensamentos divergentes, está exposto em qualquer manual de implantação do comunismo da década de vinte do século passado. Nas páginas de Arquipélago Gulag, de Aleksandr Solzhenitsyn, temos uma verdadeira aula sobre o terrorismo psicológico que a estratégia carrega enquanto constrói ditaduras sanguinárias. A chamada “prisão de consciência” é a ferramenta que manteve a ditadura cubana de pé até hoje e que vem sendo utilizada na Venezuela, nos dias de hoje, para a construção de mais um capítulo macabro do movimento comunista, sempre gerando fome, miséria e falta de liberdade. Dizia Solzhenitsyn: “Nós sabemos que eles estão mentindo, eles sabem que estão mentindo, eles sabem que sabemos que estão mentindo, sabemos que eles sabem que sabemos que estão mentindo, mas eles ainda assim estão mentindo”. Difícil não lembrar da era tucano-petista com essa frase.

A redemocratização do Brasil só foi possível devido à livre troca de informações, sem intervenção da curadoria de esquerda — na maioria, professores doutrinadores e jornalistas militantes. As mídias sociais propiciaram o palco de debate público onde a censura planejada (bem aos moldes trazidos por Solzhenitsyn) foi patrolada pelo povo, que descobriu que poderia ser agente político e fazer associações em defesa de suas ideias sem a necessidade de se vincular a sindicatos ou partidos. Graças a isso, a democracia vive seu ápice na nossa história, onde qualquer um pode ter voz sem precisar pedir autorização a ninguém.

Mas é exatamente isso o que o famoso youtuber imitador de focas, acompanhado de seus parceiros autoritários, querem destruir. Seu argumento implícito é: “Ao trocarem informações entre si, as pessoas produzem fake news antidemocráticas. Logo, precisam ser caladas, ou isso atrapalhará a democracia”. Vejam que o argumento da Foca Autoritária causa exatamente o oposto do que defende, já que pede a censura em nome da democracia. Mas não para aí: a Foca Autoritária entende que, se não forem censurados os cidadãos comuns e extinta a disputa democrática polarizada — ou seja, a própria democracia real, o modelo monopolar que ele chama democracia ruirá. É nisso que ele tenta interferir ao investir montanhas de dinheiro no patrocínio de mecanismos de censura, repressão, perseguição e tudo o que estiver ao seu alcance contra as “fake news”.

Aparentemente sem perceber ou, quem sabe, de forma proposital, a Foca Autoritária faz uma defesa ferrenha da ditadura enquanto olha com desprezo para a democracia. Aquele sistema espetacularmente abordado por Solzhenitsyn tem no youtuber um personagem contemporâneo de peso, digno da altura moral dos gélidos gulags siberianos.