OPINIÃO

Artigo: Para sempre Legião

Acompanhei a trajetória da Legião Urbana desde o início. Aliás, a primeira vez que vi Renato Russo em cena foi em 1980, no porão do Cafofo, barzinho alternativo, na 407 Norte, do hoje pianista e maestro Rênio Quintas. Ali, nas tardes de domingo, à frente do Aborto Elétrico, ele reunia jovens adeptos do punk rock em Brasília. Mas só viemos conversar três anos depois, quando, ao lado de Flávio Lemos (Capital Inicial) e Gutje (Plebe Rude), esteve no Correio para divulgar um festival que iria ocorrer no auditório da Associação Brasileira de Odontologia, na L2 Sul. A matéria publicada pelo jornal tinha como chamada Os punks estão chegando. Eles vão abrir a Temporada de Rock.

Cobri o festival e, a partir dali, mesmo ligado à MPB, passei a prestar atenção em Legião Urbana, Capital Inicial, Plebe Rude, Detrito Federal e Escola de Escândalo, bandas responsáveis por, na década de 1980, colocar Brasília no mapa da música popular brasileira.

Quando assisti a show em que Renato Russo dividiu o palco com a paulistana Cida Moreira, na Sala Funarte (hoje Cássia Eller), fiquei impressionado com a faceta de intérprete do vocalista da Legião. Ele mostrou algumas das músicas que viriam a fazer parte do disco de estreia da Legião, banda que havia formado com Dado Villa-Lobos, Marcelo Bonfá e Negrete. Mas o que guardei na memória foi o duo que ele e Cida fizeram na recriação de Summertine (George Gershim), clássico do blues imortalizado por Janis Joplin.

Como repórter, marquei presença em todos os shows da Legião na cidade — do primeiro, que fez no Teatro da Escola Parque, ao último, histórico e tumultuado no antigo Estádio Mané Garrincha. Entrevistei Renato em diversas ocasiões, tanto aqui na capital quanto no Rio. Ali, uma das vezes foi no teatro do Hotel Nacional, em São Conrado, no intervalo entre apresentação de Gal Costa, músicos brasileiros e estrangeiros em homenagem a Tom Jobim; e a de Chuck Berry Little Richard, pelo Free Jazz Festival.

Fiquei sensibilizado com a morte de Renato Russo e me alegrei quando, anos depois, Dado Viila-Lobos e Marcelo Bonfá se juntaram e saíram em turnê pelo país com shows em comemoração aos 30 anos do primeiro disco da Legião Urbana, do Dois e do Que país é este?. Por decisão da 4ª turma do Superior Tribunal de Justiça, os dois, que estavam impedidos, poderão voltar a levar as músicas da banda, em shows, para os legionários.

Mas, voltando a Renato Russo, fico imaginando o que o autor de Que país é este? (1978), se vivo estivesse, escreveria sobre o Brasil dos tempos de agora em que mais de 500 mil pessoas, vítimas da covid-19, perderam a vida, por não terem sido devidamente assistidas por um governo negacionista, sem empatia pelo próximo.