“Quando fazemos crítica à polícia carioca, não desconhecemos que não há nada mais fácil do que criticar a polícia. E isso porque policiar é uma função extremamente difícil, e cada vez mais difícil.” É após fazer essa introdução, que o brilhante escritor e jornalista Rubem Braga (1913-1990) condena, em crônica publicada ainda em 1949, os excessos da repressão a uma manifestação de estudantes que culminou na depredação de um bonde, no Rio, então capital da República.
De fato, fazer a segurança pública é missão nada fácil, e de lá para cá continuaram frequentes as ocasiões em que a polícia foi denunciada por abusos em várias partes do Brasil. No próprio Rio de Janeiro, no início do mês passado, uma controversa operação da Polícia Civil contra o tráfico na favela do Jacarezinho ganhou repercussão internacional por ter sido a mais letal da história da cidade, com 28 pessoas mortas.
Nos últimos dias, porém, foram atuações exacerbadas de policiais militares, não em combate ao crime, mas em ações arbitrárias e violentas contra cidadãos durante manifestações políticas pacíficas que chamaram a atenção. Numa delas, em Trindade, na região metropolitana de Goiânia, um professor foi preso por ter se negado a tirar de seu carro uma faixa com dizeres “Fora Bolsonaro genocida”. O militar, já afastado, alegou a Lei de Segurança Nacional para conduzi-lo à Polícia Federal, que não constatou crime e o soltou.
Em outro episódio, mais grave, policiais militares atiraram bombas de gás e dispararam tiros de balas de borracha em pessoas que, pacificamente, faziam manifestação contra o governo federal no Centro do Recife. Houve prisões e feridos, entre os quais dois homens, atingidos na face, que perderam cada um a visão de um olho. O comandante da PM foi exonerado, outros policiais, afastados, e abertas investigações para apontar os responsáveis pela truculência, já que o governo do estado negou ter ordenado a ofensiva.
Com a atual polarização política no país e as manifestações a favor e contra o governo que certamente ocorrerão em grande número nos próximos meses, o que se espera é que as forças de segurança, sobretudo as PMs, que fazem o policiamento ostensivo, ajam com equilíbrio e moderação, estritamente dentro da lei, sem excessos contra quem quer que seja. Afinal, é com os impostos cobrados dos cidadãos que se pagam os salários dos servidores públicos. É importante ressaltar, também, que as corporações são subordinadas aos Executivos estaduais.
“Queremos uma polícia dura contra o crime, mas que seja guardiã dos direitos humanos e da cidadania. Não uma polícia que atire no rosto das pessoas.” A declaração, uma das que o governador de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB), deu após o lamentável episódio na capital de seu estado, resume bem qual é a orientação que os agentes de segurança pública devem seguir.