FERNANDO TEIXEIRENSE
Consultor da Torre Comunicação e Estratégia
Ao ver estampadas nos jornais as manchetes sobre o baixo nível dos reservatórios e a possibilidade de racionamento de energia, a sensação é de que paramos no tempo. Neste mesmo espaço, em 2013, escrevi artigo intitulado Preces para São Pedro, em que discorria sobre nossa dependência das chuvas para garantir água nos reservatórios e, portanto, energia barata e abundante que fosse capaz de suprir a necessidade da sociedade brasileira por energia, incluindo as indústrias e suportando possível crescimento do PIB.
Passados oito anos, pouca coisa mudou. É verdade que, hoje, somos menos dependentes das hidrelétricas e fontes renováveis como eólica e solar deixaram de ser promessa e são realidade, compondo de forma importante nossa matriz elétrica. A questão principal que deveria nortear as ações de quem faz e organiza o planejamento energético brasileiro é qual caminho vamos seguir para garantir que tenhamos energia de base — aquela que pode ser gerada a qualquer momento — e como diversificar nossa matriz para que, no caso de São Pedro falhar, como está acontecendo agora, tenhamos opções para gerar energia e garantir o suprimento, sem que isso represente um aumento desproporcional na conta dos consumidores de energia.
O país optou por ter um sistema hidrotérmico e, por causa do enorme potencial hídrico, privilegiou a produção de energia por meio de usinas hidrelétricas. Fazia muito sentido à época. Com o passar do tempo e os sustos quando o período chuvoso não era como esperado, demos uma guinada importante e incentivamos a construção de usinas termelétricas. A elas cabe prover segurança, garantindo oferta de energia e reduzindo os riscos de racionamento. Foi um modelo considerado exitoso por algum tempo. Quando faltava água nos reservatórios, as térmicas eram acionadas. O custo da energia aumentava para todos, mas a sensação era de alívio, como que num pacto de que o mais importante era ter energia e, tão logo as chuvas voltassem, o preço voltaria a baixar.
A realidade é que o tempo passou, o custo de acionamento de térmicas a gás natural, por exemplo, ficou bem próximo ao das hidrelétricas e o Brasil ainda convive com o drama do risco de racionamento e o alto custo da energia. E não é só pelo alto índice de tributos na tarifa. É também e, sobretudo, pela falta de planejamento de longo prazo e por decisões pouco estudadas normalmente vindas do Legislativo. Está aí a Medida Provisória que pretende privatizar a Eletrobras, mas que está virando um Frankenstein e pode aumentar ainda mais o custo da energia.
O futuro ainda pode ser promissor. Nosso potencial é gigantesco. Temos muito vento no Nordeste, quando o Sul está no período seco, permitindo que se economize água dos reservatórios utilizando a energia eólica de forma quase constante. Temos gás natural, que venceu alguns preconceitos e desconhecimento e, hoje, é reconhecidamente uma fonte abundante, barata e menos nociva ao meio ambiente. Também somos detentores de um parque gerador complexo e robusto, sem falar no Sistema Interligado, um verdadeiro orgulho nacional. Mas nada disso adiantará se não tivermos planejamento e se, a cada ano, sem chuvas corrermos o risco de racionar energia, esse fato seria dramático para a combalida economia.
Passou da hora de entendermos que energia elétrica não pode ser motivo de barganha política. Tivemos o lamentável caso da Medida Provisória 579, que prometia reduzir o custo da energia e fez justamente o contrário, apesar dos avisos quase desesperados. Corremos risco de passar por coisa parecida agora com a Medida Provisória da Eletrobras e estamos vivendo um período de estiagem que nos deixou quase sem água nos reservatórios para gerar energia. Enquanto isso, ainda não colocamos para funcionar a nova Lei do Gás, que deveria, entre outras coisas, garantir o insumo para a geração de energia a preços módicos, mas esbarra em questões regionais que não são resolvidas para que os monopólios permaneçam. Todos os anos, o mesmo alerta é feito. Continuamos empurrando com a barriga uma questão que deveria ser tratada como política de Estado, e não de governo. Enquanto patinamos na (des)organização de falta de planejamento, continuaremos reféns de São Pedro e amargando a tarifa vermelha em nossas contas.