Caminhamos celeremente para atingir o trágico número de 400 mil mortes nas próximas semanas. E a contagem continua acelerada, em grande parte, devido à negligência do governo federal, que, desde o início da pandemia, minimizou o problema, optando por desprezar e boicotar qualquer ação nacional de coordenação, em parceria com estados e municípios, na implantação de medidas de isolamento que ajudassem a reduzir a propagação do vírus.
Mesmo a decisão de oferecer o indispensável auxílio emergencial ano passado só veio após muita pressão da sociedade e do Congresso Nacional, que aprovou o valor de R$ 600 contra os R$ 200 inicialmente propostos. E, coerente com essa política deliberada, o governo retardou o quanto pôde o processo de aquisição de vacinas. Bem, agora vai ter que se explicar na CPI do Senado.
Voltando no tempo, vimos os inúmeros crimes de corrupção desvendados pela Lava-Jato, que levaram à prisão muitos condenados, entre grandes empresários, doleiros, parlamentares e governadores. E a figura pública de maior relevância política alcançada foi o ex-presidente Lula, preso em 7 de abril de 2018, após decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que negou, por 6 votos a 5, recurso de sua defesa. Passados três anos, o mesmo STF anulou as sentenças proferidas pelo juiz Sérgio Moro e confirmadas anteriormente por todas as instâncias superiores, incluindo o próprio STF. Com isso, Lula voltou ao cenário da disputa eleitoral.
As duas candidaturas mais fortes atualmente postas são a do atual presidente e a do ex-presidente. Ambas têm índices de intenção de voto na casa de 30%. Como se explicam esses percentuais? Pode-se afirmar que as duas têm algumas características bastante semelhantes, sendo que uma das mais relevantes diz respeito à comunicação. Cada um deles, segundo seu estilo, tem conseguido gerar empatia com parcelas significativas da população brasileira.
Seus pronunciamentos, feitos em primeira pessoa ou por meio de publicações, são carregados de uma forte emoção, despertando sentimentos presentes no âmago das pessoas, tais como “a indignação ante os poderosos”, “o nacionalismo” ou “a síndrome de perseguição pela grande mídia“. Apresentam-se como salvadores da pátria, verdadeiras figuras paternas dispostas a acolherem cidadãos e cidadãs carentes de proteção. Os dois usam e abusam dessa narrativa!
No caso do atual presidente, há que se destacar um fator adicional, qual seja a capacidade de atuar com enorme competência naquele que o ex-governador Antônio Britto definiu como o novo endereço da política: as redes sociais. E aqui cabe um esclarecimento preliminar. Muita gente, diante da surpresa provocada pelo crescimento durante a campanha em 2018 e sua posterior vitória, preferiu contentar-se em apontar a utilização de fake news e robôs como a principal causa para o fenômeno. É claro que tais expedientes condenáveis foram e continuam sendo utilizados, mas estão longe de explicar o sucesso alcançado.
A frase de Chacrinha no título resume tudo! Comunicação é o maior desafio para quem queira se apresentar como a alternativa aos dois nas eleições de 2022. Não é a produção de peças publicitárias bem acabadas. Estamos chamando a atenção para algo que antecede a publicidade propriamente dita: a narrativa!
Ao olharmos para os nomes que têm se apresentado no cenário político, é possível identificar uma evidente desvantagem perante os dois atualmente favoritos. Fica muito clara a dificuldade de comunicação com aquela parcela de 40% da população que, segundo as pesquisas, não desejam votar nem em Bolsonaro nem em Lula. Para superar esse desafio, ouso apresentar aqui algumas pistas.
De início, entender que política é e sempre foi emoção, polarização, um sentimento primário que leva as pessoas a se mobilizarem. E com o advento das redes sociais, tal situação se fortaleceu enormemente. Insistir na crítica à polarização em si e no chamamento à racionalidade ou ao equilíbrio pode gerar admiração, mas não empolga.
Outro requisito é se colocar no lugar da maioria da população de modo a compreender os verdadeiros problemas enfrentados por ela no dia a dia. As pessoas não estão em busca de quem explique tecnicamente as causas, mas apontem as soluções possíveis e desejadas em uma linguagem de fácil entendimento.
Assim, para que uma candidatura do Polo Democrático se torne competitiva, é imprescindível ser eficaz em combinar as duas condições acima como ponto de partida para construir uma narrativa radicalizada na defesa de suas ideias, propostas, crenças e valores. Do contrário, ficará no vácuo.