Biruta é um substantivo feminino que significa indicador visual de condições de vento. As últimas notícias na área da educação mostram que os ventos não são nada favoráveis — na verdade, são bastante preocupantes. A começar pelo veto presidencial ao Projeto de Lei nº 3.477/2020, que buscava garantir acesso à internet, com fins educacionais, a estudantes e professores da Educação Básica pública. Entre as razões do veto, o presidente afirmou que a medida não apresentava estimativa do respectivo impacto orçamentário e financeiro. Os custos, por sua vez, seriam cobertos com recursos do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust), além de doações e de outros recursos previstos na lei orçamentária. Estima-se que os recursos do Fust sejam da ordem de R$ 23 bilhões.
Neste cenário de pandemia, o ensino remoto será empregado majoritariamente por nossas crianças como porta de acesso à educação ao longo de 2021, lembrando ainda que milhões delas ficaram sem estudar em 2020, exatamente porque não tiveram como acessar as aulas, por falta de conectividade. Estudos do professor André Portela, da FGV de São Paulo, apontam que, nessas condições de nenhum acesso à educação, os níveis de aprendizagem desabam para os mesmos níveis de 2018. É como se o governo atual não tivesse até aqui existido, na área da educação, para essas crianças.
Adicionalmente a essa triste notícia, veio a do artigo da jornalista Renata Cafardo, intitulado Passam a boiada no MEC, publicado no Estadão de 21 de março. Em sua coluna, ela traz o estudo do Banco Mundial que chamou de “tragédia” o que está acontecendo na educação no Brasil e em outros países latinos pelas escolas fechadas por conta da pandemia. Cerca de 70% das crianças podem deixar de aprender a ler. Em vez disso, o governo prioriza no Congresso a pauta do homeschooling, que, no máximo, vai atender a cerca de 7.500 famílias. Enquanto isso, milhões de crianças deixam de estudar por não terem acesso ao ensino remoto. Diz ainda a jornalista: “O ministro (Milton Ribeiro) nomeou uma professora ligada ao movimento Escola Sem Partido para a coordenação dos materiais didáticos. Sandra Ramos já disse que queria dar uma ‘perspectiva conservadora cristã’ à BNCC (Base Nacional Comum Curricular), o mais importante documento publicado nos últimos anos para nortear o que deve ser ensinado nas escolas e no qual as editoras de livros se baseiam. Ela ainda defende que se tire toda a menção às culturas africanas e indígenas da Base”.
E, para completar a tragédia, o lúcido artigo de Claudia Costin, uma das mais respeitadas gestoras no campo das políticas públicas da educação, intitulado A muralha da China e as instituições, desconstruindo o Inep, chama a atenção do país para o eventual desmonte que pode estar acontecendo na área da avaliação tão bem executada, ao longo de décadas, pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Diz ela: “Busca-se, agora, desconstruir o instituto que nos permite, ao fornecer dados de aprendizagem e de infraestrutura escolar, atuar com base em dados em educação”. Mais adiante, ela afirma: “Passar essa responsabilidade para o nível político do MEC e fechar a porta para especialistas da área de avaliação é destruir a parte da muralha edificada por gerações anteriores, a pretexto de resolver os problemas da educação”.
Tudo isso é extremamente desalentador, e só vem aumentar a enorme tristeza de ver todos os dias milhares de brasileiros morrendo pela covid. Apesar de meus ideais continuarem vivos, há momentos em que a tristeza bate forte, como agora. Vamos trabalhar para colocar a biruta da educação na direção certa — a de prover educação de qualidade para todas as crianças e jovens deste país. Fiz disso o meu ideal, e não vou abrir mão dele nesta etapa da minha vida.
*Titular daCátedra Sérgio Henrique Ferreira do Instituto de Estudos Avançados da USP – Ribeirão Preto e professor emérito da UFPE