Multiartista e cidadão

"Cantor, compositor, multi-instrumentista, arranjador, produtor e agitador cultural, Brown se destaca como um dos principais personagens da folia soteropolitana"

Não são poucos os que veem em Carlinhos Brown apenas um folclórico técnico do The Voice Brasil, responsável por popularizar a expressão ajayô — saudação a Oxalá, um dos orixás mais respeitados do candomblé —, originária da mitologia africana. Tida como um grito de alegria e positividade, é muito usada pelos integrantes do afoxé Filhos de Ghandy, durante o desfile no carnaval pelas ruas de Salvador. Antônio Carlos Santos de Freitas, enquanto artista, é bem mais do que isso, além de exercer como poucos a sua faceta de cidadão.

Cantor, compositor, multi-instrumentista, arranjador, produtor e agitador cultural, Brown se destaca como um dos principais personagens da folia soteropolitana, autor de sucessos da axé music na interpretação de Ivete Sangalo (Dalila), Daniela Mercury (Rapunzel), Margareth Menezes (Dandalunda), Chiclete com Banana (Meia lua inteira), Timbalada (Água mineral) e criador do Camarote Andante, bloco com acesso livre dos foliões.

Mas a atuação desse multiartista em sua cidade natal vai além do carnaval. Há vários verões, mantém, num antigo armazém na região do Comércio, próximo ao Mercado Modelo, um espaço de eventos ao qual deu o nome de Museu do Ritmo, onde já recebeu companheiros de ofício ligados aos mais diversos gêneros musicais. Por lá, já passaram Caetano Veloso, Gilberto Gil, Nando Reis, BNegão, Orquestra Rompíllez e Tribalistas, entre outros. Os shows são sempre prestigiados por baianos e turistas.

A atuação de Brown não está restrita ao que ocorre em Salvador. Ele, por exemplo, compôs, em parceria com Sérgio Mendes, Real in Rio para a trilha sonora de Rio, filme de animação do diretor Carlos Saldanha, que, em 2012, concorreu ao Oscar na categoria Melhor Canção Original. Ainda na área do entretenimento, na década passada, ele arrastou multidões superiores a 200 mil pessoas em apresentações nas ruas de Madrid, Barcelona e Bilbao, na Espanha, onde é conhecido como Carlito Marron.

Possivelmente, o trabalho dele como compositor mais bem avaliado é o que tem realizado com Marisa Monte e Arnaldo Antunes no coletivo Tribalistas, registrado nos álbuns lançados em 2002 e 2019. Músicas como Aliança, Carnavália, Diáspora, Já sei namorar, Lutar e vencer, Velha infância, que ocupam lugar de destaque no cancioneiro nacional. Com o grupo, fez um memorável concerto no Estádio Nacional Mané Garrincha, aqui na cidade, há três anos.

O cidadão Antônio Carlos é igualmente bem avaliado. Em 1994, fundou a Associação Pracatum Ação Social, organização da sociedade civil sem fins lucrativos que desenvolve programas nas áreas da educação e desenvolvimento comunitário no Candeal Pequeno, bairro de Brotas, na capital baiana. Foi lá, no extinto Candyall Gheto Square, que surgiu a Timbalada, outra das criações do músico.

No local funciona ainda uma escola de música pela qual passaram os filhos Francisco, Miguel e Clara, músicos em início de carreira, e o estúdio Ilha do Sapo, no qual gravou o disco Umbalista Verão, lançado recentemente. Este é o artista autor de Obrigado axé, uma quase oração de agradecimento que fez para Ivete Sangalo e Maria Bethânia gravarem no CD Pode entrar. Trecho da letra diz: “Isso é pra te levar na fé/ Pois Deus é brasileiro/ Muito obrigado axé...”