Quando a gente escreve nas páginas de um jornal, nunca sabe quem estará do outro lado lendo nossas matérias, refletindo sobre o que falamos, sendo tocado por nossas palavras. Vez ou outra, um leitor manda um e-mail, uma carta, reconhece nosso nome ou rosto na rua. Mas, em geral, é um ofício em que não conhecemos de fato quem são nossos leitores. Desde que entrei no Correio, sempre tive uma certeza. Que minha avó Maria Socorro estaria ali lendo tudo que eu escrevia. Ela foi minha leitora mais assídua, mais do que meus pais ou qualquer outra pessoa, talvez, até que meus editores.
No início, me ligava para comentar as matérias, parabenizar uma capa, celebrar um espaço novo. Sabia o nome de todos os meus colegas e criava uma empatia por aqueles que assinavam matérias comigo — mesmo sem nunca tê-los conhecido. Depois, com a minha normalidade nas páginas, continuou acompanhando, mas deixou as ligações para manter as conversas ao vivo quando eu ia visitá-la.
Na pandemia, quebrou o ciclo e me ligou para comentar um artigo e dizer que estava se resguardando e fazendo o que podia para se manter longe do vírus. Ela sabia que eu tinha dado um recado para alguns familiares que, na minha concepção, não estavam isolados como o período de disseminação da covid-19 pedia.
Pouco antes de ser hospitalizada, recebi uma foto dela, minha leitora número 1, segurando o jornal, lendo algum artigo que escrevi. Meu coração ficou preenchido, porque a minha avó era a minha certeza de que o meu papel de comunicar teria sempre, nem que fosse um receptor garantido. Esse é meu primeiro artigo sem essa segurança. Por isso, pedi licença para ocupar esse espaço e torcer para que, no céu, seja possível ler jornal. Assim, saberei que sempre terei minha leitora se orgulhando de qualquer lugar.