» ALDO PAVIANI
Geógrafo, Professor Emérito, docente e pesquisador do Departamento de Geografia/IH, do Núcleo de Estudos Urbanos e Regionais (NEUR) e do Núcleo do Futuro/Centro de Estudos Avançados Multidisciplinares (CEAM)
Desde o período imperial, havia quem pensasse que o Brasil poderia transferir a capital para o interior e, com isso, o povoamento ocuparia terras dos sertões do Centro-Oeste. Essa ideia geopolítica foi desejada por Joaquim José da Silva Xavier — o Tiradentes — José Bonifácio, Hipólito José da Costa e muitos outros, políticos, deputados e senadores. Na República, a ideia da transferência da capital para o interior persistiu. Inclusive um artigo foi inserido na Constituição de 1891 e tinha como propósito tornar viável a mudança da capital.
Os presidentes da República deveriam tomar iniciativas para efetivar a transferência, obedecendo a leis constitucionais. Ainda no Império, foram contratados cientistas, comandados pelo belga Louis Ferdinand Cruls, para realizar estudos indicativos de um sítio no interior com condições ambientais favoráveis para abrigar a futura capital do país. No relatório de Cruls, há ênfase nos aspectos climáticos, hidrológicos e botânicos, pondo em destaque o ambiente natural — a pedra de toque na fundação da capital.
Feita a transferência e inaugurada Brasília em 21 de abril de 1960, a base da capital foi implantada no Plano Piloto do genial arquiteto/urbanista Lucio Costa, para quem a capital deveria ser bem arborizada. Assim, a cidade nasceu com o propósito de manter o verde. Brasília emergiu com este objetivo, apesar de abertura de vias, implantação de superquadras, da Esplanada dos Ministérios e construção de prédios ter eliminado parte da vegetação original do bioma Cerrado do Distrito Federal.
A agressão ao ambiente inteiro só não foi maior porque foi criada a Novacap, que, além de cuidar de parques e jardins, se encarregou de plantar árvores aos milhares, o que é mantido nos dias correntes. Diga-se que nem sempre foram árvores próprias do ambiente natural, mas exóticas, que são visíveis na paisagem de Brasília.
Abro parênteses para enfatizar que o viço da vegetação existente é quebrado, em alguns pontos, por ações que deveriam ser mais monitoradas: o corte de árvores — muitas vezes sem a devida aprovação das autoridades — e a poda radical que mais lembra mutilações aberrantes, não planejadas. Por isto, cabe a pergunta: há necessidade comprovada de podas radicais? Pode o corte de árvores ter base em laudos técnicos que comprovem sua absoluta necessidade? Os órgãos competentes deram o seu aval para cortes e podas? Sabem os autores de podas e cortes que as árvores são vitais para a manutenção de nascentes, que por sua vez são responsáveis pela água que chega às nossas residências? Sabem também que o oxigênio que respiramos é fabricado em parte pelas árvores que nos cercam?
Uma campanha para a preservação dos biomas amazônico, do Pantanal e do Cerrado deve começar, a partir da introdução de temas ambientais nos currículos de todos os patamares educacionais. Distribuir livros que enaltecem a natureza e as áreas com cobertura vegetal, com destaque para territórios em que as matas foram agredidas com queimadas e implantação de pastos e de lavouras. Mostrar as extensões em que há riscos de desertificação e grandes áreas com perda de vegetação — enormes extensões de areia com raros tufos de vegetação e pouquíssima água. Ambiente inóspito à grande maioria de seres vivos.
No caso do DF, a mídia tem mostrado o quanto a vegetação é fundamental para manter o território livre de erosões — as voçorocas. Em Samambaia, Gama e Ceilândia, por exemplo, há áreas degradadas, onde a vegetação local foi eliminada sem reposição e sem ao menos a colocação de gramíneas para manter a coesão do solo. Daí, a força da água, no tempo do período chuvoso, provoca erosões de difícil contenção, mesmo porque o substrato rochoso é mais profundo. Ademais, muitas habitações estão em declives, algumas delas estão condenadas pela defesa civil, pois apresentam riscos de danos irreparáveis causados pelas chuvas torrenciais do verão.
Como geógrafo e ser humano, cuja sobrevivência e bem-estar dependem da natureza, propugno ampla campanha de reflorestamento, com maior atenção às vantagens de se proteger a natureza de agressões como as queimadas, cortes e podas desproporcionais e/ou desnecessárias. Proteger o verde, com certeza, elevará a qualidade do ar, do solo, dos mananciais, rios e córregos, elevando a qualidade de vida e o bem-estar da população.
Notícias pelo celular
Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.
Dê a sua opinião
O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.