ARTIGO

Seguros: conhecimento é empoderamento do consumidor

''Conhecimento é um dos caminhos para estreitar esses laços e um compromisso permanente e estratégico das seguradoras e de suas entidades de representação''

Solange Beatriz Palheiro Mendes
Advogada e diretora de Relações de Consumo e Comunicação da Confederação Nacional das Seguradoras (Cnseg) 



Comecemos esta conversa com um exemplo alegórico ou familiar: na hora de pagar a conta, alguns dos convivas não têm dinheiro suficiente para a partilha. Ato contínuo, uma parte do grupo faz vaquinha para quitar toda a despesa do restaurante. À saída, alguém cai e é socorrido no hospital próximo. Concluído o atendimento médico, a conta é apresentada, mas o paciente não tem plano nem dinheiro para quitá-la. De novo, recorre-se a uma vaquinha.

Nas duas situações, aqueles que repartiram as despesas praticaram um dos principais fundamentos do seguro: o mutualismo, ou seja, a maioria paga pequenas frações (prêmios, no jargão do mercado) do valor em risco para atender a uma minoria do grupo segurado que, na vigência do contrato de seguro, terá um sinistro — roubo do carro, dano ao imóvel, necessidade de internação etc. — fazendo jus a uma indenização para reposição do patrimônio ou pagamento da despesa médica gerada.

Por óbvio, os dois parágrafos iniciais estão longe de resumir a complexidade de um setor de reconhecido viés técnico, os desafios de produzir uma comunicação assertiva e um caminho para ser plenamente compreendido pelos consumidores e todos os demais atores da cadeia de seguros.

Mas, é fato: há um entendimento raso ou mediano do mercado que torna necessária e estratégica a educação em seguros continuada. Independentemente da renda ou da escolaridade dos consumidores, convivemos com hiatos na compreensão do funcionamento dos seguros e de suas regras mais basilares, como o mutualismo; desconhecimento dos direitos e deveres de cada parte e da abrangência (e dos limites) de suas coberturas. Enfim, não há real reconhecimento da importância do seguro para a vida das pessoas, empresas e do país.

Não só aqui, mas em todo o mundo, inclusive nos países desenvolvidos, constata-se uma subproteção em termos de seguros para cada ciclo da vida, quer seja de danos pessoais, quer seja de danos materiais. Algo que preocupa o mercado segurador porque as vulnerabilidades e riscos se materializam com uma frequência acima do imaginado nos últimos tempos, arruinando, às vezes, patrimônios, bem-estar e qualidade de vida tão arduamente conquistados.

Vale lembrar que todos os eventos importantes de nossas vidas, como a compra da casa, de um carro, uma viagem, a constituição da família, estão também cercados de riscos de perdas ou dano, havendo, no mercado, produtos que possam mitigá-los ou gerenciá-los.

A disseminação da cultura de seguros enfrenta muitos desafios. A começar pela renda do brasileiro (67% das pessoas recebiam até R$ 2 mil antes da pandemia), o que se torna um limitador de compras adequadas de seguros para cada estágio da vida pessoal ou profissional. Mas, o desconhecimento dos produtos tem peso efetivo nas decisões financeiras das pessoas, mesmo nos orçamentos mais enxutos.

Às vezes, o cidadão que aplica seu dinheiro em busca de um ganho baixo pode estar deixando a descoberto o patrimônio acumulado e perdê-lo em um infortúnio.

Em razão disso, todos os anos, o mercado de seguros participa da Semana Nacional de Educação Financeira, estratégia de Estado desenvolvida e executada anualmente em conjunto com o setor privado para apresentar ações de educação financeira, securitária, previdência. O objetivo central é permitir ao cidadão fazer uso mais consciente e responsável de seus recursos. A última edição ocorreu de 23 a 29 de novembro e teve como tema central Resiliência financeira: como atravessar a crise?.

Entretanto, dadas as características exclusivas do seguro, que as distinguem da atividade financeira e a necessidade de jogar luzes sobre a dupla relevância do setor, quer como administrador de riscos de terceiros; quer como investidor institucional, a Cnseg criou um programa específico para ampliar a compreensão de todos.

Trata-se do Programa de Educação em Seguros, que tem como lemas despertar, informar, engajar, multiplicar e empoderar os consumidores. Para tanto, são divulgadas diversas iniciativas educativas da Cnseg, das Federações associadas e do mercado na Semana Enef, para ampliar o conhecimento do consumidor, oferecendo-lhe uma visão holística do mercado, e contribuir para escolhas de coberturas mais assertivas.

No plano institucional, o Programa da Cnseg reúne uma gama de ações em prol do conhecimento. Há livretos sobre os mais variados temas do seguro (fundamentos, tipos de coberturas etc.), vídeos, podcasts, publicações (destaque para a Revista de Seguros, que tem 100 anos de circulação). Promovemos seminários ou eventos com os mais variados públicos, como o Colóquio de Proteção do Consumidor de Seguros, para reforçar o diálogo com as entidades de defesa do consumidor em todo o país e melhor conhecer a realidade regional do acesso e do atendimento aos segurados. Da mesma forma, nossa atuação é proativa nas redes sociais, por meio de uma rádio web, um canal no You Tube, Linkedin, por exemplo. Todas essas ações com o propósito de enriquecer o conhecimento de todos os stakeholders da cadeia de seguros e também melhor entender seus anseios.

Há o consenso entre nós de que a aposta em educação é promissora, porque melhora a experiência do consumidor, abre sua percepção quanto aos riscos que estão no seu entorno a cada ciclo da vida, levando-o a uma progressiva e seletiva compra de garantias. Melhor ainda: o seguro pode ser um ato de generosidade com o outro, porque pais ou provedores podem adquiri-lo e beneficiar, em caso de infortúnio, aqueles que amam. Seguro educacional para os filhos, previdência, seguro de vida, de incêndio para o imóvel, de saúde, o cardápio é farto. E inclui até nomes estranhos, como lucros cessantes, prestamista, que estão entre as mais de 100 modalidades e ramos ativos. Todos têm o mesmo propósito: proteger, acolher e permitir dias mais tranquilos em tempos de infortúnios e adversidades. Enfim, a educação securitária ainda não faz parte da rotina do brasileiro médio, mas precisa estar em seu planejamento financeiro para ampliar sua resiliência em momentos de vicissitudes. Conhecimento é um dos caminhos para estreitar esses laços e um compromisso permanente e estratégico das seguradoras e de suas entidades de representação. 

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