Visto, lido e ouvido

Desde 1960 Circe Cunha (interina) // circecunha.df@dabr.com.br

Na Terra do Nunca

Das muitas lições que podem ser aprendidas com as últimas eleições municipais, nenhuma é tão importante quanto a que demonstra a necessidade urgente de se imprimir uma verdadeira reforma na vida política do país. Os números estratosféricos relativos ao total de abstenções, dos votos em brancos e dos nulos somados mais do que alertam para essas mudanças. Servem como um sinal a indicar que a nossa jovem democracia parece ter entrado numa espécie de estado de anemia crônica, perdendo seu viço e entusiasmo precocemente.

Quando, aproximadamente, um quarto da população deixa de comparecer às urnas, mesmo diante da obrigatoriedade do voto, fica patente que nosso sistema eleitoral, pela atuação de seus atores e pelo protagonismo de suas respectivas legendas políticas, não empolga e nem motiva os cidadãos a participarem do pleito. O cansaço do eleitor, diante de um modelo de representação em que o cidadão é chamado a participar de dois em dois anos, assim mesmo, de forma transversal, diz tudo.

A verdade é que, passados os momentos de euforia com o retorno da democracia, a sensação experimentada pela população é de que embarcou numa canoa furada, com políticos e partidos avançando, ano a ano, sobre os recursos públicos, criando uma casta privilegiada de cidadãos blindados e divorciados do restante dos brasileiros, centrados apenas em seus próprios interesses.

Diante de uma situação tão bizarra em que os cidadãos não se veem representados dignamente, não surpreende que seja a Justiça Eleitoral, um organismo exótico, que foi criado justamente para impor uma certa disciplina e ordem nessa dissintonia representativa, a principal protagonista dos pleitos bianuais.

Nessas ocasiões, são os magistrados, e não os políticos, que se colocam diante dos holofotes para certificar a correção das eleições. Mas o que ocorre, por detrás dessa encenação toda, é que, a cada pleito, de maneira até monótona, repetem-se as inscrições de candidatos fantasmas, principalmente mulheres, para justificar, falsamente, os altos gastos com as campanhas, por meio de notas frias e outros malabarismos malandros, sempre trazidos à tona pela imprensa investigativa.

Muitos desses candidatos do além não chegam a receber um voto sequer, nem mesmo da mãe. O mais incrível é que todos sabem que a contabilidade dessas e de tantas outras eleições — apresentadas pelos mais de trinta partidos políticos ao TSE, e que são turbinadas com os bilhões de reais dos cofres públicos — encontram, por ocasião dos pleitos, a oportunidade certa para se transformar em pó nos desvãos da burocracia das legendas, indo engordar o patrimônio das elites partidárias que encontraram nessas siglas um negócio de ouro, melhor até que o das inúmeras igrejas neopentecostais que dominam o ambiente dentro e fora do parlamento.

A mercantilização da política e a sua apropriação por partidos por figuras demasiadamente conhecidas da população vão, a cada eleição, perdendo o sentido e se transformando numa espécie de jogo interno, envolvendo apenas as legendas e seus acólitos, com a população vendo tudo de uma arquibancada distante, indiferentes ao que se passa alhures, na Terra do Nunca.

 

A frase que não foi pronunciada
“Se os porcos pudessem votar, o homem com o balde de comida seria eleito sempre, não importa quantos porcos ele já tenha abatido no recinto ao lado.”

Orson Scott Card, escritor de ficção científica e fantasia norte-americano.

 

Popular
O Google mostra que os Correios estão na 28ª posição de busca dos internautas, com 9 milhões de pessoas acessando a internet, querendo informações sobre a empresa. Para se ter uma ideia, a Mega-Sena tem o mesmo número de acessos.

 

Real versus Virtual
Ginastas do Distrito Federal que penam por patrocínio conseguiram espaço para treinar. O Parque de Exposição do Parque da Cidade vai se transformar num ginásio para as modalidades artística, rítmica, acrobática, aeróbica e de trampolim. Falta só atualizar a página da Federação Brasiliense de Ginástica.

 

Solidariedade
Talvez, por falta de comunicação, o contêiner onde ficam os alimentos não perecíveis arrecadados pelo serviço fraterno Santa Dulce dos Pobres esteja praticamente vazio. O Santuário São Francisco de Assis, na 915 Norte está se mobilizando para ajudar na campanha. Veja mais detalhes no Blog do Ari Cunha.

 

Vai entender
A Agência Brasília divulga que o GDF está pronto para enfrentar uma possível segunda onda da covid-19 e decretou, inclusive, o fechamento de eventos e atividades culturais a partir das 23h. Mas a Secretaria de Turismo quer turbinar a chegada de turistas, o que, convenhamos, não é o ideal no momento.

 

História de Brasília
Em geral, vocês sabem. Os chefes de serviço não querem, porque continuam recebendo “dobradinha” e morando no Rio, e, morar no Rio, com ordenado dobrado é muito melhor, mesmo com terremoto.
(Publicado em 19/01/1962)