O Brasil é um dos países mais afetados pela covid-19 em todo o mundo. São mais de 170 mil vidas perdidas e mais de 6 milhões de casos reportados. Desde o início da pandemia, foram mais de 8 milhões de postos de trabalho encerrados. Tudo isso coloca uma geração inteira diante de um desafio sanitário, humanitário, social e econômico sem precedentes.
Ao mesmo tempo que enfrenta uma crise fiscal, como signatário dos principais compromissos do planeta, entre eles o Acordo de Paris e a Agenda 2030, o Brasil tem sido questionado sobre a rápida degradação ambiental e se vê numa encruzilhada. Amplia-se o risco de toda uma geração e mais uma década perdidas. Um estudo recente do IBGE apontou que já são mais de 52 milhões de pessoas na pobreza e outras 13 milhões na pobreza extrema. Por outro lado, durante a pandemia, o patrimônio de 42 bilionários cresceu US$ 34 bilhões.
O cenário de adversidades exige um olhar inovador, criativo e eficaz para quebrar um ciclo que está perpetuando a desigualdade e aprofundado significativamente a crise climática. Um relatório recente do WEF estimou que se incorporarmos aspectos sociais e ambientais na retomada econômica, podemos criar uma nova economia de USD 10 trilhões e novos 395 milhões de empregos até 2030 em todo o mundo.
Por aqui, um estudo da WRI Brasil, mostrou que uma nova modelagem econômica com políticas de baixo carbono pode gerar benefícios e oportunidades em infraestrutura, indústria e agricultura, com resultados significativos diretos em emprego e renda. O extenso estudo projeta que é possível restaurar 12 milhões de hectares, gerar 2 milhões novos empregos e incrementar R$ 2,8 trilhões no PIB até 2030.
É evidente o papel do Estado no desenvolvimento dessa nova economia. Sua atuação como um indutor ao criar um ambiente institucional e normativo favorável é fundamental. Isso torna a atração e mobilização de capital privado se torna possível. Além disso, possibilita o protagonismo empresarial no desenvolvimento de soluções para o enfrentamento dos desafios sociais e ambientais cada vez mais complexos.
Desde 2013, o Sistema B Brasil promove um movimento empresarial com o objetivo de construir um sistema econômico que seja inclusivo, equitativo e regenerativo a todas as pessoas e ao planeta. Atualmente, são mais de 180 empresas B certificadas com compromissos sociais, ambientais e econômicos. Outros 6,6 mil empreendimentos usam as ferramentas de medição, o que faz o país ser um dos maiores a adotar práticas concretas de equidade, diversidade, inclusão e enfrentamento à crise climática.
O Sistema B, por meio do Grupo Jurídico B, realiza também estudos e discussões focados em trazer para o direito brasileiro instrumentos que viabilizem e identifiquem institucionalmente os negócios que conjugam lucro com o interesse dos seus stakeholders e impacto social e ambiental positivo.
Entre as formas concretas de o Estado brasileiro contribuir para a aceleração dessa nova economia, destacam-se três. As compras públicas, por exemplo, representam 15% do PIB. O governo é um ator de mercado relevante e poderia incorporar instrumentos de medição e gestão de impacto social e ambiental, bem como a consideração de impacto como um critério relevante nos certames públicos.
É preciso instrumentalizar empresários e investidores para fortalecerem sua gestão e governança. Uma identidade jurídica como a proposta denominada “Sociedades de Benefício”, inspirada no modelo americano das Benefit Corporations, permitiria mais segurança jurídica, redução na assimetria de informação e uma infraestrutura no ambiente empresarial para que as empresas se comportem como Empresas B: com propósito, responsabilidade e transparência.
O Decreto presidencial 9977/19 recriou a Estratégia Nacional de Investimentos e Negócios de Impacto (ENIMPACTO). O país é um dos pioneiros em institucionalizar uma política de Estado de longo prazo para fortalecer o ecossistema de investimentos e negócios de impacto. Entre os êxitos da ENIMPACTO, está o desdobramento para políticas locais, dando origem ao projeto de um Sistema Nacional de Investimentos e Negócios de Impacto (SIMPACTO). Com 11 ministérios e outros 6 órgãos da administração pública sendo parte do comitê-coordenador, há um grande espaço para que o trabalho desempenhado seja incorporado na política econômica do país.
O momento que o país vive é adverso e requer atenção dos governos, empresários e da sociedade civil. Ainda assim, há evidências que nos dão esperança de um outro país possível. Com sua diversidade cultural, riqueza natural e potência econômica, o Brasil tem a chance concreta de protagonizar uma retomada econômica em direção a uma realidade mais inclusiva, equitativa e regenerativa. A decisão não é técnica e nem econômica, é política e urgente.
*Marcel Fukayama é empreendedor de impacto, cofundador do Sistema B Brasil e co-líder do GT4 - Promoção de Ambiente Institucional e Normativo Favorável ao Ecossistema de Investimentos e Negócios de Impacto.
*Rachel Avellar Sotomaior Karam é advogada, Coordenadora do Grupo Jurídico B e co-líder do GT4 - Promoção de Ambiente Institucional e Normativo Favorável ao Ecossistema de Investimentos e Negócios de Impacto.
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