VISÃO DO CORREIO

Crise sanitária pede coerência

''Agora, quando estamos às vésperas de ter um escudo contra a doença, embates políticos não podem comprometer os esforços para o enfrentamento do inimigo''

Correio Braziliense
postado em 22/10/2020 06:00 / atualizado em 22/10/2020 08:39

A decisão do presidente Jair Bolsonaro de cancelar a possível compra de vacina desenvolvida por farmacêutica chinesa revela-se inoportuna. Uma vez que um imunizante contra o novo coronavírus mostre-se seguro e eficaz e obtenha a aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o governo federal não poderá privar os brasileiros de terem acesso a doses da fórmula, independentemente de quem a tenha desenvolvido. Responsável pela avassaladora pandemia que eliminou mais de 1 milhão de vidas no planeta, o Sars-CoV-2 já superou, no Brasil, a marca de mais de 5,3 milhões de infectados e de quase 155 mil mortos. E uma vacina, hoje, é a aposta e a esperança do mundo inteiro para deter a escalada mortal desse inimigo invisível.


Por isso, a disputa eleitoral, as divergências políticas e as opções ideológicas não podem se sobrepor à responsabilidade maior do poder público: a defesa da vida dos cidadãos. O Instituto Butantan, em parceria com o laboratório chinês Sinovac, vem desenvolvendo a vacina contra o vírus, e os resultados da terceira fase têm sido um dos mais promissores, entre as muitas outras iniciativas com o mesmo objetivo: imunizar os cidadãos contra o ataque do coronavírus.


A instituição nacional é mundialmente reconhecida pela capacidade técnica e científica. Não à toa, recentemente, exportou vacinas contra a influenza para 70 países. O seu notório reconhecimento científico colocou o Butantan entre os mais respeitados institutos do mundo. O mesmo ocorre com o Instituto Oswaldo Cruz, que atua em igual campo e participa dos testes, no Brasil, com a vacina desenvolvida pela universidade britânica de Oxford. O momento exige bom senso, compromisso com a vida dos cidadãos e, sobretudo, coerência e responsabilidade.


Divergências à parte, é preciso olhar o país como um todo e governar sem discriminar ninguém. Hoje, o Brasil e o mundo, de forma geral, amargam brutal quebra na economia. No campo social, a concessão do auxílio emergencial trouxe à tona 38 milhões de brasileiros invisíveis, que não dispunham de meios para se sustentar. Com o fim da ajuda concedida durante a pandemia, surge um desafio que exigirá do governo um esforço hercúleo para que esse contingente não fique, outra vez, desassistido.


O governo reconhece o lastro das profundas e graves mazelas que a crise sanitária provocou no país, como o aumento recorde do desemprego. O coronavírus fez o mundo parar. Diante da ausência de vacina e medicamentos, grande parte da população dos países afetados foi obrigada a permanecer reclusa. Quem desafiou a orientação médica e negou a gravidade da crise se viu obrigado a recuar.


Agora, quando estamos às vésperas de ter um escudo contra a doença, embates políticos não podem comprometer os esforços para o enfrentamento do inimigo. O momento é inadequado. A racionalidade, o bom senso e, sobretudo, a responsabilidade em defesa da vida se impõem e estão acima dos interesses individuais.

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