Opinião: Um jogo de lições

Diante de todo esse show de horror que, inclusive faz parte da decisão de permitir o acontecimento da partida, ao menos, há uma situação que traz uma luz e resgata os conceitos que realmente fazem o futebol ser uma paixão nacional e mundial: as histórias por trás das quatro linhas

Flamengo/Instagram/Reprodução - Montagem com fotos do goleiro Hugo Souza




A partida entre Flamengo e Palmeiras no último domingo pelo Campeonato Brasileiro ficará marcada na história. Boa parte da narrativa de forma negativa. Foi o momento em que ficou ainda mais evidente a despreocupação dos times com a pandemia da covid-19, que ainda assola o Brasil. Na verdade, isso já estava claro desde o momento em que os clubes pressionaram e aceitaram o retorno dos jogos de futebol no Brasil praticamente ao mesmo tempo que na Europa, em situações distintas da disseminação da doença em cada local.

O Campeonato Carioca, por exemplo, voltou em 18 de junho, quando o Brasil tinha mais de 40 mil mortes pelo novo coronavírus e estava no terceiro dia superando o número de 1.200 falecimentos — hoje o país tem mais de 140 mil vítimas da doença. Um dia antes, em 17 de junho, o Campeonato Inglês voltou. Na época, a Inglaterra tinha mais de 40 mil mortos, mas uma média de menos de 200 mortes em 24 horas.

Mas a bola rolou no Brasil nos campeonatos regionais e, a partir de agosto, pelo Brasileirão, mesmo com a pandemia em curso. Alguns times tiveram casos de jogadores e integrantes com covid-19 e tudo ocorreu “normalmente”. Até o surto no Flamengo, que mostrou uma disseminação veloz entre a equipe — e também fora dela levando em consideração os casos registrados no Independiente del Valle após partida com os contaminados pela Libertadores —, e gerou toda a polêmica em torno da mais recente partida com o Verdão. A questão gerou uma discussão e ações judiciais que tinham, em sua maioria, uma preocupação com resultado dentro de campo. Não necessariamente a saúde dos envolvidos.

Diante de todo esse show de horror que, inclusive faz parte da decisão de permitir o acontecimento da partida, ao menos, há uma situação que traz uma luz e resgata os conceitos que realmente fazem o futebol ser uma paixão nacional e mundial: as histórias por trás das quatro linhas. Neste caso, mais especificamente o enredo de Hugo Souza, de 21, anos.

Quarto goleiro do time titular do Flamengo, o jovem não jogava uma partida havia nove meses. Agarrou a oportunidade (e a bola) com toda a força que tinha e mostrou como o futebol — e o esporte, em geral — tem o poder de mudar vidas e realizar sonhos. Lá estava Neneca, como é apelidado, defendendo a chance que teve em meio a todo esse caos e nos presenteado com uma história emocionante de superação de um garoto que só queria um momento para mostrar seu potencial e orgulhar o pai, que, agora, o assiste do céu.

E mostrou, com uma narrativa linda, que não apaga tudo que aconteceu, mas que encerra essa partida com gosto agridoce nos lembrando da importância dos sonhos e da força do esporte. Que a história do futebol possa voltar a ser escrita com enredos bonitos, como o de Hugo, não os extras campos que demonstraram o total desrespeito à saúde dos envolvidos independentemente do “lado”.

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