Sai ano, entra ano, a temporada de chuva pega as cidades despreparadas. Cenas dos estragos causados pelas águas se repetem com trágica monotonia. Ruas alagadas, pontes destruídas, moradores desalojados, famílias desabrigadas, dezenas ou centenas de cadáveres tornaram-se tão naturais que temos dificuldade de saber se são imagens de arquivo ou gravação ao vivo.
Deslizamentos de terra e destruição de moradias erguidas em áreas de risco se multiplicam à medida que as cidades incham e forçam a população vulnerável a se instalar na periferia distante. Sem fiscalização, sob o olhar cúmplice do Estado e da sociedade, residências precárias são erguidas sem preocupação com a segurança.
Governadores e prefeitos mostram-se surpreendidos com ventos, trovoadas e tempestades como se ainda vivessem na época dos pajés. Sem ciência para explicar os fenômenos, os sacerdotes indígenas atribuíam os fenômenos a seres sobrenaturais. Punham na conta de Tupã a responsabilidade pela violência das forças brutas da natureza.
As autoridades, ao desconhecer os avanços da ciência, reprisam o comportamento dos pajés. Lavam as mãos, atribuindo a tragédia à fatalidade, ao recorde dos índices de chuvas e às mudanças climáticas. Em adição, lembram gestões anteriores, que não fizeram as obras que deveriam ter sido feitas. Prometem estudos e ações para cobrir falhas pretéritas. Passada a comoção, nada ou pouco é feito.
É mais fácil transferir responsabilidades do que assumir que a tragédia é evitável. Existem políticas públicas capazes de antecipar-se aos dramas marcados por dor, sangue, lama e enchentes. O inferno não são os outros. São os governantes que, independentemente da experiência ou da cor política, pouco ou nada fazem para impedir as catástrofes.
Impõe-se prevenir. Além das medidas de curto e longo prazo, há as ações que devem ser tomadas agora, antes da chegada do dilúvio. São iniciativas simples, mas importantes, como recolher o lixo, limpar as bocas de lobo, tapar buracos, inspecionar pontes e viadutos, desobstruir o caminho das águas.
Urbes brasileiras nasceram sob o signo da improvisação. Subiram morros e encostas. Represaram rios. Passaram o trator sobre a vegetação. Resultado: asfalto e cimento roubaram o espaço de escoamento da água. Mesmo as cidades planejadas como, Belo Horizonte e Brasília, pagam o preço da imprevidência.
Em novembro, prefeitos serão eleitos ou reeleitos. É importante analisar o programa de governo e eleger os candidatos comprometidos com o verbo prevenir em vez de remediar. Vale lembrar: político não cai do céu para ocupar palácios, assembleias ou câmaras. É eleito. Voto tem consequência.